quinta-feira, 27 de março de 2008

As Palavras que Nunca Te Direi - Cap 2

Capitulo 2


"Estavas chorando?" perguntou Penny quando Kate entrou na varanda, trazendo a garrafa e a mensagem.


Com a confusão, tinha-se esquecido de jogar fora a garrafa.Kate sentiu-se embaraçada e limpou os olhos enquanto Penny pousava o jornal e se levantava da cadeira.


- Estás bem? Que aconteceu lá fora?


Kate abanou a cabeça.


- Não, nada disso. Acabei de encontrar esta carta e... não sei, depois de a ler não me contive.


- Uma carta? Que carta? Tens certeza que estás bem? - A mão de Penny gesticulava compulsivamente enquanto fazia as perguntas.


- Estou bem, sério. A carta estava numa garrafa. Encontrei-a na praia. Quando a abri e a li... - A sua voz sumiu-se, e o rosto de Penny aligeirou-se apenas um pouco.


- Oh... ainda bem. Por um instante pensei que tivesse acontecido alguma coisa horrível. Como se alguém te tivesse atacado ou coisa do género.


Kate afastou uma madeixa de cabelo que tinha sido atirada pelo vento para a cara e sorriu perante a preocupação dela.


- Não, foi só a carta que me impressionou verdadeiramente. É besteira, eu sei. Não devia ter sido tão sentimental. E desculpa ter te assustado.


- Oh, puu - disse Penny, não ligando.


- Disseste que a carta te fez chorar? Porquê? O que é que dizia?


Kate limpou os olhos, entregou-lhe a carta, e dirigiu-se para a mesa de ferro forjado onde Penny estivera sentada. Sentindo-se ainda um pouco ridícula por ter chorado, fez o possível para se compor.

Penny leu a carta devagar, e quando acabou, olhou para Kate. Os seus olhos também lacrimejavam. Afinal não era só ela.


- É... é bela - disse Penny por fim. - É uma das coisas mais comoventes que alguma vez li.


- Foi o que pensei.


- E encontraste-a na praia? Quando corria?


Kate acenou que sim com a cabeça.


- Não sei como é que ela pode ter dado à costa ali. A baía é abrigada do resto do oceano, e nunca ouvi falar em Wrightsville Beach.


- Também não sei, mas parece que foi lançada à praia ontem à noite. A principio quase que passava por ela, antes de ter reparado no que era.


Penny passou o dedo pelas letras e fez uma breve pausa.


- Gostaria de saber quem eles são. E porque estava selada dentro de uma garrafa?


- Não sei.


- Não sentes curiosidade?


A verdade era que Kate estava de fato curiosa. Logo depois de a ter lido, lera de novo, depois uma terceira vez. Como seria, meditou ela, ter alguém que a amasse daquela maneira?


- Um pouco. Mas e depois? Não há maneira de alguma vez virmos a saber.


- Que vais fazer com ela?


- Guardá-la, suponho. Na verdade ainda não pensei assim tanto no assunto.


- Hmmm - disse Penny com um sorriso indecifrável. Depois: - Como foi o teu jogging?


Kate deu um gole no copo que tinha enchido de suco.- Foi bom. O Sol estava muito bonito quando nasceu. Parecia que o mundo estava a arder.


- Então, qual é o programa para hoje?- Pensei em irmos fazer umas compras e almoçar na cidade.


- Era o que esperava que dissesses.


As duas mulheres conversaram sobre os lugares onde poderiam ir. Depois Penny levantou-se e foi buscar mais uma caneca de café e Kate observou-a a entrar.Penny tinha quarenta anos e seguramente a melhor pessoa que ela conhecia. Era entendida em música e arte, e no trabalho, as gravações de Mozart ou Beethoven irrompiam continuamente do seu escritório para o caos da redação. Vivia num mundo de otimismo e bom humor, e toda a gente que a conhecia a adorava.Quando Penny voltou para a mesa, sentou-se e olhou para a baía.


- Não é este o lugar mais bonito que alguma vez viste?


-Sim, é. Estou contente por teres me convidado.


- Estava precisando. Terias ficado completamente sozinha naquele teu apartamento.


- Parece a minha mãe.


- Vou considerar isso um elogio.


Penny estendeu a mão através da mesa e pegou de novo na carta. As suas sobrancelhas erguiam-se, enquanto lia atentamente a carta, mas optou por não dizer nada. Na opinião de Kate, parecia que a carta tinha despoletado algo na memória de Penny.


- O que foi?- Estava só pensando... - disse ela baixinho.


- No quê?- Bem, pensando se não poderíamos publicar isto na tua coluna esta semana.


- Do que estás falando? Penny debruçou-se sobre a mesa.


- Daquilo mesmo que disse. Deveríamos publicar a carta na tua coluna esta semana. Tenho a certeza de que outras pessoas adorariam lê-la. É de fato extraordinária. As pessoas precisam de ler algo como isto de vez em quando. E é tão comovente. Posso imaginar uma centena de mulheres a recortá-la e a colá-la nas suas agendas ou geladeiras para que os seus maridos possam vê-la quando chegam em casa do trabalho.


- Nós nem sequer sabemos quem eles são. Não achas que devíamos primeiro obter a sua autorização?


- Aí está o problema. Não podemos. Posso falar com o advogado no jornal, mas tenho a certeza de que é legal. Não usaremos os nomes verdadeiros, e desde que não atribuamos a autoria da carta a nós mesmos ou revelemos a sua possível origem, estou certa de que não haverá problemas.


- Eu sei que provavelmente é legal, mas não tenho a certeza se é correto. Quer dizer, é uma carta muito pessoal. Não deve ser divulgada para todo mundo ler.


- É uma história de interesse humano, Kate. As pessoas adoram esse tipo de coisas. Além disso, não há nada aí que possa ser embaraçoso para ninguém. É uma bela carta. E lembra-te, esse tal Jack enviou-a numa garrafa pelo oceano. Ele sabia que ela iria ser encontrada.


Kate abanou a cabeça.


- Não sei, Penny...- Bem, pensa no assunto. Pensa o dia todo se for preciso. Eu acho que é uma bela ideia.

Kate pensava efetivamente na carta enquanto se despia e se metia debaixo do chuveiro. Deu por si a interrogar-se sobre o homem que a tinha escrito - Jack, se esse fosse o seu nome verdadeiro.


E quem seria Sarah? A sua amante ou a sua mulher, obviamente, mas já não se encontrava perto dele. Estaria morta? ou teria acontecido outra coisa qualquer que os forçara a separarem-se? E porque fora ela selada numa garrafa e lançada ao sabor das correntes? Tudo aquilo era estranho.


Os seus instintos de jornalista tomaram então conta dela, e subitamente pensou que a mensagem poderia não significar nada. Podia ser alguém que queria escrever uma carta de amor mas não tinha ninguém a quem enviá-la.


Mas à medida que as palavras se desenrolavam novamente na sua cabeça, ela percebeu que essas possibilidades eram improváveis. A carta obviamente vinha do coração. E pensar que um homem a tinha escrito!


Em todos os seus anos de vida, nunca recebera uma carta que se aproximasse minimamente daquela. Sentimentos comoventes que lhe fossem parar à mão vinham sempre brasonados com logotipos do género dos cartões de parabéns da Hallmark.


James nunca fora um grande escritor, nem mais ninguém com quem ela tivesse namorado. Como seria um homem como este? perguntava-se a si mesma. Seria ele tão atencioso em pessoa como a carta parecia sugerir?Kate ensaboou e enxaguou o cabelo e à medida que a água fresca rolava pelo seu corpo abaixo, as perguntas iam dissipando-se na sua mente.


Olhou para si mesma ao espelho enquanto acabava de se enxugar com a toalha. Nada mal para uma mulher de trinta e seis anos com um filho adolescente, pensou para consigo. Os seus seios haviam sido sempre um tanto pequenos, e embora isso a tivesse preocupado quando era mais nova, estava contente agora por não terem começado a cair como os de outras mulheres da sua idade. O seu estômago era liso, e as pernas compridas e magras devido a todo o exercício ao longo dos anos. Tão pouco os pés-de-galinha à volta dos cantos dos olhos pareciam sobressair, embora isso não fizesse qualquer sentido.


De uma maneira geral, estava satisfeita com o seu aspecto naquela manhã, e atribuiu às férias essa aceitação invulgarmente fácil de si própria.Depois de aplicar um pouco de maquilagem, vestiu-se.


Lá fora na varanda, Penny tinha posto o cafe na mesa. Havia melão e toranjas, juntamente com doughnuts torrados. Depois de se sentar no seu lugar, espalhou um pouco de queijo-creme magro sobre os doughnuts - Penny estava de novo numa das suas intermináveis dietas - e as duas conversaram durante um bom bocado de tempo. Desmond tinha saído para jogar golfe, como faria todos os dias daquela semana. Desmond e Penny estavam juntos há vinte anos.


Namorados de faculdade, tinham casado no Verão depois da formatura, logo depois de Desmond ter aceito um emprego numa firma de contabilidade no centro de Chicago. Oito anos mais tarde Desmond tornou-se sócio e eles compraram uma casa espaçosa, onde tinham vivido sozinhos durante os últimos doze anos.Sempre quiseram ter filhos, mas depois de seis anos de casamento Penny ainda não conseguira engravidar. Ela não podia por isso sua relação sofrera alguns problemas, mas o sentimento de ambos permaneceu sólido, e Penny virou-se para o trabalho para preencher o vazio na sua vida.


Começou no Chicago Tribune quando as mulheres eram escassas e foi gradualmente subindo na escala da empresa. Quando se tornou diretora, dez anos atrás, começou a acolher mulheres jornalistas sob a sua asa. Kate fora a sua primeira estudante.


Depois de Penny se arrumava, Kate levantou-se e foi até ao telefone.


- Olá. É a Kate. O Kevin está por aí?


- Oh, olá. Claro que está. É só um segundo.


O telefone caiu tinindo sobre a mesa e Kate ouviu Ana chamá-lo:- Kevin, é para ti. A Kate está ao telefone.


O fato de não ter sido referida como mãe de Kevin magoou-a mais do que esperava, mas não teve tempo para pensar muito no assunto.Kevin estava sem fôlego quando chegou ao telefone.


- Olá, mãe. Tudo bem? Como estão as férias?


Ela sentiu uma pontada de solidão ao ouvir a sua voz. Ainda era aguda, de criança, mas ela sabia que era apenas uma questão de tempo antes de começar a mudar.


- É muito bonito, mas só cheguei ontem à noite. Ainda não fiz muita coisa a não ser correr esta manhã.


- Havia muita gente na praia?


- Não, mas vi algumas pessoas irem para lá quando estava voltando. Ei, quando é que partes com o teu pai?


- Daqui a dois dias. As férias dele só começam na segunda-feira, e é então que partimos. Queres falar com ele?


- Não, não é preciso. Estou telefonando para dizer que espero que te divirtas muito.


- Vai ser espetacular. Vi um folheto sobre a viagem no rio. Alguns dos rápidos parecem ser o máximo.


- Bem, tu tem cuidado.


- Mãe, já não sou nenhuma crianca .


- Eu sei. É só para tranquilizar a tua mãe antiquada.


- Está bem, eu prometo. Vou usar o meu colete salva-vidas o tempo todo. - Ele fez uma breve pausa. - Sabes, não vamos ter telefone, por isso não vamos poder falar até eu voltar.


- Já imaginava. Deve ser muito divertido, mesmo assim.


- Vai ser o máximo. Quem me dera que pudesses vir conosco. íamos divertir-nos bastante.


Ela fechou os olhos durante um momento antes de responder, um truque que o terapeuta lhe ensinara. Sempre que Kevin dizia algo sobre os três estarem de novo juntos, ela tentava certificar-se de que não diria nada de que pudesse arrepender-se mais tarde. Assim a sua voz soava tão otimista quanto lhe era possível.


- Tu e o teu pai precisam de algum tempo juntos. Eu sei que ele tem sentido muito a tua falta. Agora têm de pôr em dia muita coisa, ele anseia por esta viagem há tanto tempo quanto voce. Pronto, não fora assim tão difícil.


- Ele te disse isso?


- Sim. Várias vezes. Kevin ficou calado.


- Vou ter saudades tuas, mãe. Posso telefonar pra você?


- Claro. Podes telefonar-me em qualquer hora. Adoraria saber tudo sobre a viagem. Te amo, Kevin.


- Eu também, mãe.


Ela desligou o telefone, sentindo-se simultaneamente alegre e triste, como normalmente se sentia sempre que falavam ao telefone quando ele estava com o pai.


- Quem era? - disse Penny atrás dela.

- Era o Kevin.

- Ele está bem? - Ela abriu o armário e agarrou numa máquina fotográfica para completar o conjunto.

- Está . Parte dentro de dois dias.

- Muito bem, isso é bom. - Pendurou a máquina ao pescoço.

- E agora vamos as compras.


Fazer compras com Penny era uma experiência. Uma vez chegadas a Provincetown, passaram o resto da manhã e o princípio da tarde em várias lojas. Kate comprou três novos conjuntos de roupa antes de Penny a arrastar para um lugar chamado Nightingales, uma loja de lingerie.Penny ficou completamente entusiasmada lá dentro. Não por ela mesma, claro, mas por Kate.


A desinibição de Penny era das coisas que Kate mais gostava. Ela realmente não se importava com o que as outras pessoas pensassem, e Kate muitas vezes desejara poder ser como ela.Depois de aceitar duas das sugestões de Penny - afinal ela estava de férias -, as duas passaram alguns minutos na loja dos discos. Kate comprou um CD de jazz de uma das gravações mais antigas de John Coltrane.


Ao voltarem para casa, Desmond estava lendo o jornal na sala de estar.


- Olá. Estava ficando preocupado com vocês duas. Como foi o dia?


- Foi bom - respondeu Penny. - Almoçámos em Provincetown, depois fizemos algumas compras. Como correu o teu jogo hoje?


- Bastante bem. Se não tivesse falhado nos dois últimos buracos, teria conseguido um oitenta.


- Bem, vais simplesmente ter de treinar um pouco mais até conseguires jogar como deve ser.


Desmond riu-se.- Tu não te importas?


- Claro que não.


Desmond sorriu enquanto folheava ruidosamente o jornal, satisfeito por poder passar muito do seu tempo no campo de golfe durante aquela semana. Reconhecendo o sinal de que ele queria voltar à sua leitura, Penny sussurrou ao ouvido de Kate. "Aprende comigo. Deixa um homem jogar golfe e ele nunca se chateia com o quer que seja."

Kate deixou-os sozinhos durante o resto da tarde. Uma vez que o dia ainda estava quente, foi para a praia.Depois de uma hora ao sol, Kate percebeu que estava com calor e foi até à água. Arrastou-se mar adentro até a cintura e depois mergulhou quando uma pequena onda se aproximou. A água fresca fê-la arfar quando a sua cabeça emergiu à superfície, e um homem que se encontrava ao lado dela riu-se.


- Refrescante, não é? - disse ele, e ela concordou com um aceno de cabeça enquanto cruzava os braços.Ele era alto com cabelo escuro da mesma cor que o dela, e por um segundo ela interrogou-se se ele não estaria a paquera-la. Mas as crianças por perto depressa acabaram com essa ilusão com gritos de "Papá!" e depois de mais alguns minutos na água, ela saiu e voltou para a sua cadeira. A praia estava ficando vazia. Arrumou as suas coisas e iniciou o caminho de volta.


Em casa, Desmond estava vendo golfe na televisão e Penny lendo um romance com a imagem de um advogado jovem e bonito na capa. Penny levantou os olhos do livro.- Como estava a praia?


- Estava ótima. O sol estava maravilhoso, mas a água dá-te uma espécie de choque quando mergulhas.


- É sempre assim. Não vejo como as pessoas conseguem aguentar estar lá dentro durante mais que uns minutos.


Kate pendurou a toalha num varal perto da porta e falou por cima do ombro.- Como é o livro?


Penny virou o livro ao contrário nas suas mãos e olhou para a capa.


- Maravilhoso. Me lembrar o Desmond de alguns anos atrás.


Desmond resmungou sem tirar os olhos da televisão. - Hem?- Nada, querido. - Voltou a sua atenção de novo para Kate. Os seus olhos estavam a brilhar. - Queres jogar um pouco?


Penny adorava jogos de cartas de qualquer tipo. Pertencia a dois clubes de bridge, jogava como uma campeã, e mantinha um registro de todas as vezes que ganhava um jogo de paciência. Mas blackjack fora sempre o jogo que ela e Kate jogavam quando tinham tempo, porque era o único em que Kate tinha realmente alguma chance de ganhar.


- Claro. - Penny dobrou a página com alegria, pousou o livro, e levantou-se.


Kate começou a organizar as suas cartas.


- Conheceste alguém interessante?


- Na verdade, não. Apenas li e relaxei ao sol. Quase todos estavam lá com as suas famílias.


- Pena.


- Porque dizes isso?


- Bem, estava mais ou menos com esperanças de que conhecesses alguém especial esta semana. Estava com esperança de que encontrasses um homem para ti esta semana. Um que tirasse teu folego.


Kate levantou o olhar, surpresa.


- O que é que fez com que pensasses isso?


- O sol, o oceano, a brisa, não sei.


- Na verdade não tenho estado à procura, Penny.


- Nunca?


- Não muito, de qualquer maneira.


- Não passou assim tanto tempo desde o divórcio.


- Já passaram quase três anos. Não tens ninguém em vista que tenhas andado a esconder de mim?

- Não.


- Ninguém?Penny tirou uma carta do baralho e descartou um quatro de copas.


- Não. Mas não sou apenas eu, sabe? É difícil conhecer pessoas hoje em dia. Não tenho propriamente tempo para sair e conhecer pessoas.


- Eu sei isso, sei mesmo. É só que tens tanto para oferecer a alguém. Eu sei que existe alguém para ti em algum lugar.


- Tenho certeza de que existe. Simplesmente não o encontrei ainda.


- Procuras, pelo menos?- Quando posso. Mas a minha patroa é uma verdadeira chata, sabe. Não me dá um minuto de descanso. Piscou.


- Talvez devesse falar com ela.


- Talvez devesse - concordou Kate, e riram-se ambas. Penny tirou do baralho e descartou um sete de espadas.


- Não tens mesmo saído com ninguém?


- Não desde que o Mark Qualquer-coisa me disse que não queria uma mulher com filhos.


Penny franziu a testa durante um momento.


- às vezes os homens conseguem ser uns verdadeiros idiotas, e ele era um exemplo perfeito. É o tipo de homem cuja cabeça devia estar pendurada numa parede com uma placa a dizer "Macho Egocêntrico Típico". Mas eles não são todos assim. Há montes de verdadeiros homens por esse mundo fora - homens que se podiam apaixonar por ti num abrir e fechar de olhos.


- É por isso que gosto de ti, Penny. Dizes as coisas certas sempre.


Penny tirou uma carta do baralho.


- Mas é verdade. Acredita em mim. És uma mulher de sucesso, bonita, inteligente. Conseguiria encontrar uma dúzia de homens que adorariam sair contigo. Nem sequer dás uma oportunidade para que isso aconteça.


Kate encolheu os ombros.


- Talvez não. Mas isso não significa que vá morrer sozinha num lar qualquer para velhas solteiras mais tarde na vida. Acredita, adoraria apaixonar-me de novo. Adoraria conhecer um cara maravilhoso e viver feliz para sempre. Simplesmente não posso fazer disso uma prioridade neste momento. O Kevin e o trabalho já me ocupam o tempo todo.


Penny não respondeu durante um momento.


- Eu acho que tens medo.


- Medo?


- Não que haja algo de errado nisso.


- Porque dizes isso?


- Porque eu sei o quanto James te magoou, e sei que teria medo de que a mesma coisa voltasse a acontecer se fosse eu. É a natureza humana. Gato escaldado.... como diz o velho ditado. Há muita verdade nisso.


- Mas tenho a certeza de que se o homem certo aparecer, eu saberei. Tenho fé.


- Que tipo de homem procuras?


- Porque estás tão interessada?


- Oh, faz lá a vontade a uma velha amiga, está bem?


- Está bem. Nada de bando de motoqueiros, isso é certo - disse ela com um abano da cabeça. Pensou durante um momento. - Humm... acho que mais do que tudo, teria de ser o tipo de homem que seria fiel para comigo, ao longo de toda a nossa relação. Eu já tive o outro tipo de homem, e não aguento uma relação como aquela de novo. E penso que também gostaria de alguém da minha idade ou próximo, se possível.


Kate parou ali e franziu as sobrancelhas um pouco.


- E?


- Creio que ficaria pelos clichés habituais. Gostaria que ele fosse bonito, gentil, inteligente, e que tivesse charme, sabes, todas aquelas coisas boas que as mulheres querem num homem.


Fez novamente uma pausa. Penny revelava o seu prazer em colocar Kate contra a parede.


- E?- Teria de passar tempo com Kevin como se fosse o seu próprio filho - isso é mesmo importante para mim. Ah - e teria de ser romântico, também. Adoraria receber flores de vez em quando. E atlético, também. Não posso respeitar um homem se o puder ganhar no braço de ferro.


- É tudo?


- Sim, é tudo.


- Então, deixa-me ver queres um homem de trinta e tal anos, bonito, charmoso e fiel, que seja também inteligente, romântico e atlético. E tem de ser bom para o Kevin, certo?


- É isso mesmo.Ela respirou fundo enquanto colocava a sua mão sobre a mesa.


- Bati.


Depois de perder três vezes, Kate foi para dentro para começar a ler um dos livros que trouxera. Sentou-se no parapeito da janela na parte de trás da casa enquanto Penny voltou para o seu próprio livro.


Depois do pôr do Sol, os três foram dar um passeio de carro até Hyannis e jantaram no Sam's Crabhouse, um próspero restaurante que merecia a sua reputação. Estava cheio e tiveram de esperar uma hora por uma mesa, mas os caranguejos cozidos a vapor e a manteiga valiam a pena. A manteiga tinha sido condimentada com alho, e em duas horas beberam cerca de seis cervejas.


Lá para o fim do jantar, Desmond perguntou pela carta que tinha dado à praia.


- Li quando voltei do golfe. Penny tinha prendido na geladeira.


Penny encolheu os ombros e riu-se. Voltou-se para Kate com uma expressão nos olhos que dizia "Eu te disse" mas não disse nada.


- Encontrei quando corria. Desmond acabou a sua cerveja e continuou.


- Era uma carta e tanto. Parecia muito triste.


- Eu sei. Foi o que senti quando a li.


- Sabes onde fica Wrightsville Beach?


- Não. Nunca ouvi falar.- É na Carolina do Norte - disse Desmond enquanto metia a mão num bolso à procura de um cigarro.Kate perguntou:


- Onde na Carolina do Norte?

- Perto de Wilmington, ou efetivamente pode até ser mesmo uma parte de Wilmington, não tenho bem a certeza quanto às fronteiras. Se fores de carro, fica a cerca de hora e meia a norte de Myrtle Beach. já ouviste falar do filme Cape Fear?


- Já.- O rio Cape Fear é em Wilmington, e foi aí que os filmes foram rodados.


- Como é que nunca ouvi falar nela?


- Não sei. julgo que não atrai muita atenção por causa de Myrtle Beach, mas é popular lá no sul. As praias são muito bonitas - areia branca, água quente. É um ótimo local para se passar uma semana se alguma vez tiveres a oportunidade.Kate não respondeu, e Penny falou de novo com uma insinuação de malícia no seu tom de voz.


- Bem, agora já sabemos de onde é o nosso escritor misterioso.


Kate encolheu os ombros.- Suponho que sim, mas ainda não se pode ter a certeza absoluta.


- Realmente tens pensado bastante no assunto, não tens?


- Instintos. Aprende-se a segui-los, e estaria disposta a apostar em como Wrightsville Beach ou Wilmington é onde ele vive.


- E então? Já pensaste melhor sobre a publicação da carta?


- Na verdade não. Ainda não sei se é uma boa ideia.


- E que tal se não usarmos os nomes deles - apenas as iniciais? Podemos até mudar o nome de Wrightsville Beach, se quiseres.


- Porque é isto tão importante para ti?


- Porque sei reconhecer uma boa história. Mais do que isso, penso que seria importante para muita gente. Hoje em dia, as pessoas andam tão atarefadas que o romantismo parece estar lentamente a morrer. Esta carta mostra que ele ainda é possível.


Kate pegou distraidamente num fio de cabelo e começou a enrolá-lo. Um hábito desde a infância, era o que fazia sempre que estava a pensar em algo. Depois de um longo momento, respondeu finalmente.


- Está bem.


- Vais fazê-lo?


- Sim, mas como disseste, usaremos apenas as suas iniciais e omitiremos a parte sobre Wrightsville Beach. E escreverei algumas frases como introdução.


- Fico muito contente - exclamou Penny, com um entusiasmo de menina. - Eu sabia que o farias. Enviamo-la por email amanhã.


Mais tarde naquela noite, Kate escreveu o começo da coluna à mão numas folhas de papel que encontrou na gaveta da mesa no pequeno escritório. Quando terminou, foi para o seu quarto, colocou as duas páginas na prateleira à cabeceira da cama, depois deitou-se. Naquela noite dormiu irregularmente.
No dia seguinte, Kate e Penny foram até Chatham e pediram que a carta fosse digitada numa lan house. Nenhuma trouxera o seu notebook e Kate insistia para que uma parte da informação fosse excluída da coluna, parecia a coisa mais lógica a fazer. Quando a coluna ficou pronta, enviaram-na por email. Ia ser publicada na edição do dia seguinte.O resto da manhã e da tarde foi passado como no dia anterior fazendo compras, repousando na praia, conversas descontraídas, e um jantar delicioso. Quando o jornal chegou cedo na manhã seguinte, Kate foi a primeira a lê-lo. Acordou cedo, terminou a sua corrida antes de Penny e Desmond se levantarem e depois abriu o jornal e leu a coluna.

"Há quatro dias, quando estava de férias, escutava algumas velhas canções na rádio e ouvi o Sting a cantar Message in a Bottle. Estimulada pelo seu canto apaixonado, corri até à praia para encontrar uma garrafa só para mim. Passados poucos minutos encontrei uma, e claro está, tinha uma mensagem lá dentro. (Na verdade, não ouvi a canção primeiro: inventei isso como efeito dramático. Mas encontrei realmente uma garrafa numa destas manhãs com uma mensagem profundamente comovente lá dentro.) Não tenho conseguido deixar de pensar nela, e apesar de não se tratar de um assunto sobre o qual eu normalmente escreveria, numa época em que o amor e o compromisso duradouros parecem estar tão pouco disponíveis, esperei que a achassem tão importante como eu a achei."


O resto da coluna era dedicada à carta. Quando Penny se juntou a Kate para o lanche, leu também de imediato a coluna antes de olhar para qualquer outra.


- Maravilhoso - disse ela quando acabou. - Vais receber muita correspondência por causa desta coluna.


- Achas que sim?


- Tenho certeza absoluta.


- Mais até do que o costume?


- Toneladas a mais. Sinto-o.


- Veremos - disse Kate enquanto comia um doughnut, não sabendo ao certo se deveria acreditar ou não em Penny, mas mesmo assim curiosa.


CONTINUA...

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