segunda-feira, 7 de abril de 2008

As Palavras que Nunca Te Direi - Cap 6

Capitulo 6


Durante a tarde que passava Jack procurou ocupar-se com os afazeres da loja. Fato era que estava mesmo intrigado com a bela moca que conhecera pela manha.

Fazia tempo que ele nao pensava nisso. Sua historia com Sarah comecara no colegial e nao tivera fim ate a sua fatidica morte - atropelamento - uma consequencia pois na verdade ela esta com cancer.

Vivera sim, os momentos mais lindos da sua vida. apos perde-la, o pai era seu amigo nas horas vagas e fazia de tudo para ajudar o filho, queria ve-lo feliz novamente.

Sempre dizia que ele era muto jovem para se entregar daquela maneira, ele merecia uma segunda chance. Mas Jack tinha a resposta para ele na ponta da lingua : Duvido que ache outra capaz de substitui-la.

Sentado no seu escritorio porem, Jack nao estava pensando em Sarah naquela tarde. A imagem que o acompanhava era a de Kate, com seus cabelos cacheados e jeito seguro. Tinha de admitir, gostara dela e estava feliz por convida-la para velejar.

Jack Shepard foi para a marina com alguns minutos de antecedência para poder aprontar o Happenstance. Retirou a cobertura das velas, abriu a cabine, e fez um exame geral ao barco.
O seu pai tinha aparecido um pouco antes dele sair.

- Queres aparecer lá em casa para jantar? Jack respondera que não podia.
- Vou sair com o barco hoje à noite, com uma pessoa.

O pai tinha ficado calado durante um momento.

- Com uma mulher?

Jack explicou resumidamente como ele e Kate se tinham conhecido.

- Finalmente um encontro - comentara o pai.
- Não, pai, não é um encontro, vamos apenas andar de barco.
- É bonita?
- Isso interessa?
- Não interessa. Mas ainda assim parece um encontro. Adorava implicar com o filho.
- Não é um encontro.
- Se voce diz, ok ja entendi. Sorriu.

Jack viu-a caminhar ao longo da doca um pouco depois das sete, vestia shorts jeans e uma camiseta vermelha sem mangas carregava um pequeno cesto de piquenique numa mão e um casaco leve na outra. Ela não parecia tão nervosa quanto ele, nem a sua expressão revelava o que ela pensava quando se aproximou.


Quando ela acenou, ele sentiu a familiar sensação de culpa e acenou rapidamente em resposta antes de acabar de desatar as cordas. Estava resmungando consigo mesmo e fazendo o seu melhor para pôr a mente em ordem quando ela chegou ao barco.

- Olá - disse ela, descontraidamente. - Espero que não tenha esperado muito.

Ele tirou as luvas enquanto falava.

- Oh, olá. Acabei de chegar estou preparando o barco.

- Posso ajudá-la a subir?

Ele estendeu o braço. Kate entregou o que tinha en maos. Quando ele pegou nas mãos dela para a puxar para cima, ela sentiu os calos nas palmas das suas mãos e um arrepio percorreu-lhe a espinha. Depois de ela estar segura a bordo, ele fez um gesto em direção à roda do leme, dando um pequeno passo para trás.

- Está pronta para zarpar?
- Quando você estiver.
- Então sente-se e fique à vontade. Eu vou tirar o barco. Quer beber alguma coisa antes de partirmos? Tenho refrigerantes na geladeira.

Ela abanou a cabeça.

- Não, obrigado.

Olhou em volta do barco antes de encontrar um lugar para se sentar ao canto. Lentamente o Happenstance começou a recuar para fora do seu lugar. Uma vez seguro nas águas do Canal, Jack virou o barco na direção do vento e içou depressa a vela.


Num movimento rápido, Jack estava ao lado de Kate, encostando o seu corpo perto do dela.

Antes que ela tivesse tempo de pestanejar, ele estava de volta à roda do leme, fazendo ajustes e olhando por cima do ombro para a vela, certificando-se de que fizera tudo corretamente.

Ele olhou de novo para ela. Sarah costumava sentar-se no mesmo lugar, e com o Sol poente repartindo as sombras, houve um breve momento em que ele pensou que era ela. Mas afastou o pensamento e tossiu.

O barco ganhara velocidade. Ao observa-lo na tarefa, os movimentos dele rápidos e precisos deixavam os músculos tensos e Kate pode perceber pela primeira vez uma tatuagem no ombro esquerdo. Levantou-se e caminhou na direção de Jack, parando quando chegou ao lado dele. Soprava uma brisa, e embora ela pudesse sentir no rosto, não parecia suficientemente forte para encher a vela.

- Pronto, acho que conseguimos - disse ele com um sorriso fácil, olhando para ela.

Dirigiam-se para a enseada. Ela sabia que ele estava concentrado no que estava fazendo, e por isso manteve-se calada enquanto permanecia ao seu lado. Do canto do olho, observava-o - as mãos fortes na roda do leme, as pernas compridas transferindo o seu peso de um lado para o outro à medida que o barco se inclinava ao vento.

No intervalo da conversa, Kate perguntava-se sobre como seria Jack. Com trinta e tal anos, provavelmente. Olhar para ele de perto não ajudava muito - tinha a cara bronzeada o que lhe dava um aspecto que sem dúvida o fazia parecer mais velho do que era.
Ele era o homem mais bonito que já tinha visto, alem disso havia nele algo de cativante, indefinível.

Durante a tarde, quando falara com Penny ao telefone, ela tentara descrevê-lo, mas tivera dificuldades em fazê-lo porque ele não se parecia com a maioria dos homens que ela conhecia em Chicago. Dissera a Penny que ele tinha aproximadamente a idade dela, que era atraente e estava em boa forma, Fora a descrição mais próxima da realidade que conseguira fazer, embora após vê-lo de perto novamente, achasse que não estivera muito longe da verdade.

Penny ficou excitadíssima quando ela lhe contou que ia dar um passeio de barco à tardinha, embora Kate tivesse passado por um momento de dúvida logo a seguir. Por um instante preocupou-se com o fato de estar sozinha com um estranho - especialmente em alto mar - mas convenceu-se de que os seus receios não tinham fundamento. Era como qualquer outro encontro, dissera a si mesma durante a maior parte da tarde. Por fim, decidiu que era algo que tinha de fazer, principalmente por ela mesma.

Quando se aproximaram da enseada, Jack virou a roda do leme em direção às águas profundas do Canal. Jack olhava de um lado para o outro, observando os outros barcos enquanto mantinha o leme estável. Tudo parecia estar em movimento sob o céu escurecido da Carolina do Norte.

Kate cruzou os braços e foi buscar o casaco.Vestiu-o, satisfeita por tê-lo trazido. O ar parecia já muito mais fresco do que quando tinham partido. O Sol descia mais depressa do que ela esperava.

Pela primeira vez no que parecia ser uma eternidade, ela fizera algo de completamente espontâneo, algo que não poderia ter imaginado fazer há menos de uma semana. E agora que estava feito, não tinha a certeza do que esperar. "E se Jack se revelasse o contrário do que ela havia imaginado? Se isso acontecesse, regressaria a Chicago com a sua resposta..." mas por enquanto, esperava não ter de partir imediatamente. Queria mais.


- Pronto, assim deve estar bem - disse ele, dando pancadinhas na roda do leme para ver se ela ficava em posição. - Podemo-nos sentar agora se quiser.

- Não tem de segurar?

- É para isso que serve o laço. às vezes - quando o vento está mesmo incerto - tem que segurar no leme. Mas tivemos sorte com o tempo hoje. Podíamos velejar nesta direção durante horas.

Com o Sol a pôr-se lentamente no céu de fim de tarde por trás deles, Jack conduziu Kate de volta para onde estivera sentada. Depois de se certificar de que não havia nada atrás dela que lhe pudesse estragar a roupa, eles sentaram-se no canto - ela na parte lateral, ele contra a parte de trás - diagonalmente, para poder olhar um para o outro. Sentindo o vento contra o rosto, Kate puxou o cabelo para trás, olhando para a água.

Jack observou-a a fazer esse gesto. Ela era mais baixa do que ele - cerca de um metro e setenta, calculou - com um rosto belo, cheio de sardinhas e um corpo que lhe fazia lembrar os modelos que ele vira em revistas. Mas apesar de ela ser fisicamente atraente, havia qualquer coisa mais nela que o atraía. Era inteligente, pôde pressentir isso imediatamente, e confiante, também, como se fosse capaz de viver a sua vida de acordo com as suas próprias condições. Para ele, essas eram coisas que realmente interessavam. Sem elas, a beleza nao era nada.

- Isto é mesmo bonito - disse ela finalmente, virando-se para ele. - Obrigada por me ter convidado.

Ele ficou contente quando ela quebrou o silêncio.

- O prazer é todo meu. É bom ter companhia de vez em quando.

Ela sorriu com a resposta dele, perguntando a si mesma se seria verdade o que ele dizia.

- Costuma sair sozinho?

Ele recostou-se no banco enquanto falava, esticando as pernas para a frente.

- Normalmente. É uma boa maneira de desanuviar depois do trabalho. Por mais tenso que tenha sido o dia, quando estou aqui, o vento parece varrer tudo para longe.

- O mergulho é assim tão difícil?

- Não, não é o mergulho. Essa é a parte divertida. É mais ou menos tudo o resto: a papelada no escritório, lidar com pessoas que cancelam as suas aulas à última hora, certificar-me de que a loja tem a quantidade certa de tudo. Tudo isto pode tornar um dia cansativo.

- Não duvido. Mas gosta, não gosta?

- Sim, gosto. Não trocaria o que faço por nada. - Ele fez uma pausa e ajustou o relógio no punho. - Então, Kate, o que é que faz? - Era uma das poucas perguntas seguras em que ele pensara durante o curso da tarde.

- Sou colunista do Chicago Tribune.

- Está aqui de férias?

Ela fez uma breve pausa antes de responder.

- Mais ou menos.

Ele acenou com a cabeça, como se estivesse à espera daquela resposta.

- Sobre o que é que escreve?

Ela sorriu.

- Escrevo de tudo um pouco. - Ela reparou na expressão de surpresa nos seus olhos, a mesma expressão em que reparava sempre que saía com alguém pela primeira vez. Mais vale acabar com isto logo, pensou para consigo. - Tenho um filho - continuou ela. - Tem doze anos.

Ele levantou as sobrancelhas.

- Doze?
- Parece chocado.
- E estou. Não parece ter a idade suficiente para ter um filho com doze anos.
- Vou considerar isso um elogio - disse ela com um sorriso afetado. Não se sentia ainda preparada para revelar a sua idade. - Mas, sim, ele tem doze anos. Quer ver uma foto?
- Claro - disse ele.

Ela encontrou a carteira, tirou a fotografia, Jack olhou para ela durante um momento, depois para Kate.

- Ele tem a sua cara - disse ele, devolvendo a fotografia. - É bem parecido.
- Obrigada. - Enquanto guardava a fotografia, perguntou. - E você? Tem filhos?
- Não. - Ele abanou a cabeça. - Nenhum filho. Pelo menos nenhum de que eu saiba. - Ela riu-se com a resposta dele, e ele continuou: - Como se chama o seu filho?
- Kevin.
- Ele está aqui ?
- Não, está com o pai na Califórnia. Divorciámo-nos há uns anos.

Jack acenou com a cabeça, sem fazer qualquer julgamento, depois olhou por cima do ombro para outro barco à vela passando ao longe. Kate também o observou durante um momento, e no silêncio, reparou em como tudo era calmo ali no oceano.

- Gostaria de ver o resto do barco? - perguntou Jack. Ela acenou com a cabeça.
- Adoraria.

Quando ele abriu a porta fez uma pausa, de súbito dominado pelo fragmento de uma recordação há muito esquecida, mas agora desenterrada talvez pela novidade da presença daquela mulher.

Kate passou por ele em silêncio, deixando-o na privacidade dos seus pensamentos. Se ela reparara na hesitação dele, não o demonstrara, e por isso Jack estava-lhe grato.

à esquerda de Kate, um assento cobria um dos lados do barco - largo e suficientemente comprido para que alguém pudesse dormir nele confortavelmente; no lado oposto do assento estava uma pequena mesa com espaço suficiente para duas pessoas se sentarem. Junto à porta havia uma pia e um fogão a gás e uma pequena geladeira por baixo, e mesmo em frente uma porta dava para a cabine de dormir.

Ele manteve-se afastado num dos lados com as mãos na cintura enquanto ela explorava o interior, examinando tudo. Não pairou sobre o ombro dela como alguns homens teriam feito mas em vez disso deu-lhe espaço. Mesmo assim, podia sentir os olhos dele a observá-la, embora ele não fosse indiscreto ao fazê-lo. Depois de um momento ela disse:

- De fora ninguém diria que é tão grande.
- Eu sei. - Jack tossiu desajeitadamente. - Surpreendente, não é?
- Sim, é. Parece ter tudo o que uma pessoa precisa.
- E tem. Se quisesse, podia ir até à Europa. Não que o recomende. Mas é ótimo para mim.
Ele contornou-a e dirigiu-se a geladeira, dobrando-se para tirar uma lata de Coca-Cola do seu interior. - Já quer beber alguma coisa?
- Está bem - disse ela, passando as mãos pelas paredes, sentindo a textura da madeira.
- O que é que quer? Tenho Seven-Up e Coca-Cola.
- Pode ser Seven-Up - respondeu ela. Ele entregou-lhe a lata. Os seus dedos tocaram-se brevemente.
- Não tenho gelo a bordo, mas está fria.
- Vou tentar sobreviver - disse ela, e ele sorriu.

Ela abriu-a e bebeu um gole antes de a colocar sobre a mesa.

Enquanto abria a sua lata, ele olhava para Kate, pensando no que ela dissera antes. Tinha um filho com doze anos... e como colunista, isso queria dizer que provavelmente tinha frequentado a universidade. Se ela esperou até depois de terminar o curso para se casar e ter um filho... isso faria com que ela tivesse cerca de quatro ou cinco anos mais do que ele. Não tinha aspecto de ser muito mais velha do que isso, nao mesmo ja fora uma surpresa saber que ela tinha um filho alem do mais ela não se comportava como a maioria das mulheres de vinte e poucos anos que ele conhecia na vila. O seu comportamento revelava maturidade, algo que apenas aqueles que tinham já experimentado a sua parte de altos e baixos na vida conseguiam alcançar.

Ela voltou a sua atenção para uma fotografia emoldurada pendurada na parede. Nela, Jack Shepard estava de pé num pontão com um espadim que ele tinha pescado, parecendo muito mais novo do que era agora. Na foto ele sorria largamente, e a expressão alegre fazia-a lembrar-se de Kevin sempre que marcava um gol quando jogava futebol.
Interrompendo aquela pausa súbita ela disse:

- Vejo que gosta de pescar. - Ele aproximou-se dela, e quando chegou perto, ela sentiu o calor irradiando dele. Ele cheirava a sal e vento.
- Sim, gosto - disse ele baixinho. - O meu pai era pescador de camarões, e pode dizer-se que eu fui praticamente criado na água.
- Quantos anos tem esta foto?
- Essa tem cerca de treze anos - foi tirada mesmo antes de eu voltar para o último ano de faculdade. Houve um concurso de pesca, e eu e o meu pai decidimos passar duas noites na Corrente do Golfo e apanhamos esse espadim a cerca de sessenta milhas da costa. Levou quase sete horas para trazê-lo para cima porque o meu pai queria que eu aprendesse a fazê-lo à moda antiga.
- O que é que isso quer dizer?

Ele riu-se baixinho.

- Basicamente significa que as minhas mãos ficaram cortadas em pedaços quando finalmente acabei, e mal podia mexer os ombros no dia seguinte. A linha que tínhamos escolhido não era na verdade suficientemente forte para um peixe daquele tamanho, por isso tivemos de deixar que o espadim nadasse até parar, depois recolher a linha lentamente, depois deixá-lo nadar de novo o dia inteiro, até o bicho estar muito cansado para continuar a lutar.
- Como no Velho e o mar de Hemingway.
- Parecido, só que eu não me senti como um velho até ao dia seguinte. O meu pai, por outro lado, podia ter representado o papel no filme.

Ela olhou de novo para a fotografia.

- O seu pai é aquele ao seu lado?
- Sim, é ele.
- É parecido contigo - disse ela.

Jack sorriu um pouco, interrogando-se se aquilo seria um elogio ou não. Ele fez sinal em direção à mesa, e Kate sentou-se defronte dele. Depois de se instalar, disse:

- Disse que tinha frequentado a faculdade?

Ele olhou-a nos olhos.

- Sim, estive na Universidade da Carolina do Norte e formei-me em Biologia marinha.
- Então comprou a loja.
Ele abanou a cabeça,
- Não, pelo menos não logo a seguir. Depois de me formar, trabalhei para o instituto Marítimo de Duke como especialista de mergulho, mas isso não dava muito dinheiro. Então, arranjei um certificado para dar aulas e comecei a aceitar estudantes ao fim-de-semana. A loja surgiu alguns anos mais tarde.
- Ele ergueu uma sobrancelha. - E você, Kate?

Kate bebeu mais um gole da Seven-Up antes de responder.

- A minha vida não é assim tão emocionante como a sua. Cresci em Omaha, Nebraska, e fui para

a escola em Brown. Depois de me formar, andei em dois ou três lugares, e tentei algumas coisas diferentes, acabando por me fixar em Chicago. Estou no Tribune há nove anos mas só nos últimos anos como colunista. Antes disso era repórter.
- Gosta de ser colunista?

Ela pensou durante um momento, como se estivesse a pensar no assunto pela primeira vez.

- É um bom emprego - disse ela finalmente. - Muito melhor agora do que quando comecei. Tenho a liberdade de escrever sobre o que gosto, desde que esteja dentro do assunto da minha coluna. Pagam-me muito bem, também, quanto a isso não me posso queixar, mas... - Ela fez uma nova pausa. - Já não é assim tão estimulante. Não me interprete mal, eu gosto do que eu faço, mas por vezes sinto como se estivesse a escrever as mesmas coisas. Mesmo isso não seria tão mau, porém, se não tivesse tantas outras coisas que fazer com Kevin. Creio que neste momento sou a típica mãe solteira com excesso de trabalho, se entende o que quero dizer.

Ele acenou afirmativamente com a cabeça e disse baixinho:

- A vida muitas vezes não acontece como gostariamos, hum?
- Não, suponho que não - disse ela, e olharam-se de novo nos olhos. A expressão dele fê-la interrogar-se sobre se ele havia dito algo que raramente dizia a qualquer outra pessoa. Ela sorriu e inclinou-se para ele.
- Está pronto para comer qualquer coisa? Trouxe umas coisas no cesto.
- Quando a Kate estiver.
- Espero que goste de sanduíches e saladas frias. Foram as únicas coisas em que consegui pensar que não se estragavam.
- Parece melhor do que aquilo que eu teria comido sozinho. Se fosse só eu, provavelmente teria ido comer um hamburger antes de partir para o mar. Quer comer aqui ou lá fora?
- Lá fora, decididamente.

Pegaram nas latas de refrigerante e saíram da cabine. Jack fez sinal para ela seguir em frente sem ele.

- Dê-me um minuto para lançar a âncora. Assim podemos comer sem nos preocupar - disse ele. Kate chegou ao seu assento e abriu o cesto. Tirou dois sanduíches embrulhados em celofane, assim como uns recipientes de plástico com salada coneslaw.

Ela olhava para Jack enquanto ele descia as velas. à medida que ele trabalhava de costas viradas para ela, Kate reparou de novo como Jack parecia forte. De onde estava sentada, os músculos dos ombros pareciam mais largos do que se apercebera a princípio, ampliados pela sua cintura pequena. Ela não conseguia acreditar que estava de fato a velejar com aquele homem, quando apenas dois dias antes estivera em Chicago. Tudo aquilo parecia surreal.

Enquanto Jack trabalhava sem parar, Kate olhava para cima. Agora que a temperatura tinha baixado, a brisa estava mais forte, e o céu escurecia lentamente.
Jack lançou a âncora quando o barco parou completamente. Esperou cerca de um minuto, para se certificar de que estava presa, e quando se deu por satisfeito, foi sentar-se ao lado de Kate.

- Gostaria que houvesse alguma coisa que pudesse fazer para ajudar - disse Kate com um sorriso. Ela lançou o cabelo para cima do ombro tal como Sarah costumava fazer, e por um momento ele nada disse.

- Está tudo bem? - perguntou Kate. Ele acenou que sim com a cabeça, subitamente desconfortável de novo. - Aqui estamos bem. Se o vento continuar a aumentar, teremos de velejar à bolina um pouco mais quando voltarmos.

Ela pôs salada juntamente com um sanduíche no prato dele e entregou-lhe, percebendo que ele estava sentado mais perto dela do que estivera antes.

- Vamos demorar mais tempo para voltar nesse caso?

Jack pegou num dos garfos de plástico branco e comeu um bocado da salada. Levou um momento antes de responder.

- Um pouco, mas não haverá problemas, a não ser que o vento pare por completo. Se isso acontecer, ficaremos imobilizados.
- Suponho que isso já lhe tenha acontecido antes.

Ele acenou com a cabeça.

- Uma vez ou duas. É raro, mas acontece.

Ela parecia confusa.

- Porque é que é raro? O vento não está sempre soprando?
- No oceano normalmente está sempre.
- Porquê?

Ele sorriu achando graça à pergunta e pousou o sanduíche no seu prato.

Enquanto Jack explicava cientificamente o que acontecia, ela nao conseguia para de olhar para o rosto dele. Os olhos intensos pareciam tao lindos mas guardavam um que de tristeza. E os labios... eram realmente convidativos. Ela abriu a boca deixando escapar um som e percebendo sacudiu a cabeca para afastar os pensamentos e mordeu os labios. Ele percebeu.

- O que foi?
- Nada.
- Acho que te intediei com essa conversa. Ela sorriu.
- Desculpe, por um momento me senti muito longe, deve ser o mar. Disfarcou.
- Acontece. Pensando em alguem especial?
- Nao, faz tempo que nao tem alguem assim na minha vida.

O modo como ela pronunciou aquilo a surpreendeu.

- Parece que isso a deixa triste.
- De certa forma, sim. Voce nao se sente so? Ou existe uma sra.Shepard?

Ele desviou os olhos do olhar fixo dela e concentrou-se na porta da cabine. Depois de um momento acrescentou, quase para si mesmo: - Sim, me sinto. Sou viuvo.

Passaram-se alguns segundos.

- Jack?

Sobressaltado, Jack olhou para Kate.

- Desculpe... - começou ele.
- Está bem? - Ela olhava para ele com uma mistura de preocupação e perplexidade.
- Estou bem... parece que foi minha vez de viajar...- improvisou Jack.
- Eu sinto muito.
- Tudo bem, chega de falar de mim. Se não se importar, Kate... conte-me algo sobre você.
- Mas acho que falei quase tudo. Nao sou assim tao interessante...
- Eu nao acredito no que voce disse. Tudo bem, eu pergunto. Disse que esteve casada uma vez?

Ela acenou afirmativamente com a cabeça.

- Durante oito anos. Mas James - é o nome dele - parece que perdeu o interesse pela relação, por uma razão ou por outra... acabou por ter um caso. Eu simplesmente não conseguia viver com isso.
- Eu também não conseguiria - disse Jack baixinho - mas isso não torna as coisas mais fáceis.
- Não. - Ela fez uma pausa e bebeu um gole do seu refrigerante. - Mas nos davamos bem, apesar de tudo. Ele é um bom pai para Kevin, e isso é tudo o que eu quero dele agora. Pronto, é a sua vez.

Jack começou do princípio, falando sobre como era crescer em Wilmington como filho único. Disse que a mãe tinha morrido quando ele tinha doze anos, acabando por crescer e ser educado praticamente no mar pelo fato do pai passar a maior parte do tempo no barco. Falou sobre os seus dias de faculdade - omitindo algumas das histórias mais loucas que poderiam dar uma impressão errada de si mesmo - e descreveu como tinha sido começar com a loja e como era o seu dia-a-dia naquele momento. Estranhamente, nada disse sobre Sarah, e Kate nao insistiu.

Enquanto conversavam, o céu escurecia e o nevoeiro começava a assentar em redor deles. Com o barco balançando levemente sobre as ondas, uma espécie de intimidade desceu sobre eles. O ar fresco, a brisa nos seus rostos, e o movimento suave do barco, tudo conspirava para desanuviar o nervosismo que haviam sentido antes.

Nem uma única vez ela sentiu alguma pressão de Jack para que ela voltasse a vê-lo, nem ele parecia esperar algo mais dela naquela noite. A maioria dos homens que conhecera em Chicago parecia partilhar da atitude de que se eles haviam se esforçado para ter uma noite agradável. Era uma atitude adolescente - Mas típica apesar de tudo - e ela achou a mudança refrescante.

Quando chegaram a um intervalo na conversa, Jack recostou-se e passou as mãos pelo cabelo. Fechou os olhos e parecia estar a saborear um momento silencioso e privado. Enquanto ele fazia isso, Kate colocou tranquilamente os pratos usados e os guardanapos no cesto para evitar que eles fossem atirados ao mar pelo vento. Quando se sentiu pronto Jack levantou-se.

- Acho que está na hora de voltarmos - disse ele, quase como se lamentando que a viagem estivesse chegando ao fim.

Alguns minutos mais tarde o barco estava de novo em movimento, e ela reparou que o vento era muito mais forte do que antes. Jack estava ao leme, mantendo o Happenstance no seu rumo. Kate estava a seu lado recapitulando a conversa que tinham tido. Nenhum deles falou durante um bom bocado, e Jack Shepard interrogava-se porque razão se sentia tão confuso.

Ainda no leme, ele recordou algo que Sarah lhe disse no último passeio de barco, depois de fazerem amor, Sarah estava deitada ao lado de Jack, passeando levemente os dedos pelo peito dele, nada dizendo.

"- Em que estás pensando? - perguntou ele finalmente.
- Simplesmente não sabia ser possível amar alguém tanto quanto eu te amo - murmurou ela.
Jack passou o dedo pela maçã do rosto dela. Os olhos de Sarah não largavam nunca os seus.
- Eu também não sabia - respondeu ele baixinho. - Não sei o que faria sem ti.
- Promete-me uma coisa?
- Qualquer coisa.
- Se me acontecer alguma coisa um dia, Promete-me que vais procurar outra pessoa.
- Acho que nunca conseguirei amar outra pessoa a não ser você.
- Promete-me mesmo assim, está bem?
Ele levou um momento para responder.
- Está bem, se isso te faz feliz, eu prometo."

Estranho lembrar disso agora. Quando a recordação se dissipou finalmente, Jack tossiu e tocou no braço de Kate com a mão para lhe chamar a atenção. Ele apontou para o céu.

- Olhe para tudo isto - disse ele finalmente, fazendo o seu melhor para manter a conversa neutra. - Antes de haver sextantes e bússolas, eles usavam as estrelas para navegar os mares. Ali, pode ver a Estrela Polar. Aponta sempre exatamente ao norte.

Kate olhou para o céu.

- Como é que sabe que estrela é que é?
- Usa-se outras estrelas como sinais. Consegue ver a Ursa Maior?
- Sim.
- Se desenhar uma linha reta a partir das duas estrelas que perfazem a ponta da colher, elas apontarão para a Estrela Polar.

Kate observava-o enquanto ele apontava para as estrelas a que se referia, meditando sobre Jack e as coisas que o interessavam. Vela, mergulho, pesca, navegação pelas estrelas - tudo o que tivesse a ver com o oceano. Ou tudo aquilo, assim parecia, que lhe permitisse estar horas a fio sozinho.

Perguntava a si mesma porque razão nunca aprendera tais coisas quando era mais nova, e interrogava-se sobre o homem que as aprendera. E subitamente ela soube exatamente porque razão Sarah se apaixonara por ele. Não por ser extraordinariamente atraente, ou ambicioso, ou até encantador. Ele era tudo isso, mas mais importante, parecia viver a vida à sua maneira. Havia algo de misterioso e diferente na maneira como ele se comportava, algo masculino. E isso tornava-o diferente de todas as pessoas que ela conhecera antes.

Jack olhou-a de relance quando ela não respondeu e mais uma vez reparou em como ela era bela. Na escuridão a sua pele pálida parecia etérea, e deu por si a imaginar como seria passar a mão levemente pelo perfil daquela face. Abanou então a cabeça, tentando afastar o pensamento.

Mas não conseguia.


A brisa soprava por entre o cabelo dela, e essa visão fez com que sentisse um aperto no estômago. O cheiro de lavanda estava presente no ar. Há quanto tempo não se sentia daquela maneira? Há tempos, certamente. Sabia isso também enquanto olhava para ela. Não era nem a hora certa nem o lugar certo... nem a pessoa certa. Lá no fundo, perguntava a si mesmo se tudo voltaria a estar certo como antes.

- Espero que não esteja a aborrecê-la - disse ele finalmente, com uma calma forçada. - Eu sempre me interessei por esse tipo de histórias.

Ela olhou para ele e sorriu.

- Não, eu gostei da história.

Embora Jack tivesse dito que normalmente velejava sozinho, ela perguntava-se se ele já teria levado para o alto mar outras pessoas para além de Sarah e ela. E se nunca o tivesse feito, que isso queria dizer? Sabia que ele a observara com atenção naquela noite, embora nunca tivesse sido indiscreto. Mas mesmo que estivesse curioso em relação a ela, mantivera os seus sentimentos bem escondidos. Ele não a pressionara por informações que ela não estava disposta a dar, não fizera nada naquela noite que pudesse ser interpretado como sendo mais do que uma atenção ocasional.

Jack ligou um interruptor, e uma série de pequenas luzes acenderam-se à volta do barco. Não suficientes para que se pudessem ver bem um ao outro, mas para que os outros barcos os pudessem vê-los. Apontou para o negrume da costa:

- A enseada fica mesmo ali, entre as luzes - e virou a roda do leme naquela direção.
- Então - perguntou ele por fim -, gostou da sua primeira viagem num barco à vela?
- Gostei. Foi maravilhoso.
- Fico contente. Não foi uma viagem ao hemisfério Sul, mas foi quase tudo o que pude fazer.

Permaneceram ao lado um do outro, ambos aparentemente perdidos em pensamento. Outro barco à vela apareceu na escuridão a um quarto de milha de distância, regressando também à marina. Desviando-se, Jack olhou de um lado para o outro, certificando-se de que mais nada apareceria. Kate notou que o nevoeiro tornara o horizonte invisível.

Quando se aproximaram da costa, Kate duvidou subitamente de que voltariam a se ver. Dentro de alguns minutos estariam de volta às docas e iriam despedir-se um do outro. Ela duvidava que ele lhe pedisse para o acompanhar de novo, e ela mesma sentia-se insegura com tudo isso.

Quando chegaram à doca, Kate foi até à popa buscar o seu cesto e o casaco e depois deteve-se. Pensando por um momento, pegou no cesto, mas em vez de agarrar no seu casaco, empurrou-o parcialmente para baixo da almofada do assento com a sua mão livre. Quando Jack perguntou se estava tudo bem, ela clareou a garganta e disse:

- Vim só buscar as minhas coisas. - Dirigiu-se para o flanco do barco, e ele ofereceu-lhe a mão. De novo ela sentiu a sua força quando a aceitou, e desceu do Happenstance para a doca.

Olharam um para o outro apenas por um instante, como que querendo saber o que sucederia a seguir, até que Jack por fim apontou para o barco.

- Tenho que preparar o barco, e vai demorar.

Ela acenou com a cabeça.

- Pensei que fosse dizer isso.
- Posso acompanhá-la até ao carro primeiro?
- Claro - disse ela, e ele começou a caminhar ao longo da doca com Kate ao lado. Quando chegaram ao carro alugado, Jack ficou a observá-la vasculhar o cesto à procura das chaves. Depois de as encontrar, ela abriu a porta do carro.
- Como já disse, foi uma noite maravilhosa, gostei muito - disse ela.
- Também eu.
- Devia levar mais pessoas para andar de barco. Tenho certeza de que iriam gostar.
Sorrindo ele respondeu:
- Vou pensar nisso.

Durante um instante, os seus olhos encontraram-se, e por um momento ele viu Sarah na escuridão.

- É melhor voltar - disse ele depressa, ligeiramente embaraçado. - Tenho de acordar cedo amanhã. - Ela acenou com a cabeça, e não sabendo o que fazer, Jack estendeu-lhe a mão.
- Gostei muito de te conhecer, Kate. Espero que se divirta durante o resto das suas férias.

Apertar-lhe a mão pareceu um pouco estranho depois do fim de tarde que tinham acabado de passar juntos, mas ela teria ficado surpreendida se ele tivesse feito algo de diferente.

- Obrigado por tudo, Jack. Foi um prazer conhecê-lo, também.

Ela tomou o seu lugar à frente do volante e ligou a ignição. Jack fechou-lhe a porta e ouviu-a engatar o carro. Sorrindo para ele uma última vez, Jack acenou quando ela arrancou e ficou a olhar até o carro deixar por fim a marina. Depois de ela ter partido, ele caminhou de volta para as docas, perguntando a si mesmo porque razão se sentia tão inquieto.

Vinte minutos mais tarde, na mesma hora em que Jack terminava de arrumar o Happenstance, Kate abriu a porta do seu quarto de hotel e entrou. Atirou as coisas para cima da cama e dirigiu-se ao banheiro. Salpicou a cara com água fria e escovou os dentes antes de se despir. Depois, deitada na cama apenas com a luz do candeeiro acesa, ela fechou os olhos, pensando em Jack.

Ela sabia que ele havia sido sincero e ela ficou intrigada com a sua conduta. No entanto as suas ações pareciam algumas vezes distantes. Lembrou-se do casaco. Sera que exagerara? De verdade, seu medo maior era entender o quanto ele ainda prendia-se ao fantasma de Sarah.

Mas já estava feito. Ela tomara a sua decisão, e agora não podia voltar atrás.



CONTINUA...

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