quinta-feira, 24 de abril de 2008

As Palavras que Nunca Te Direi - Cap 10

Capitulo 10



Cedo na manhã seguinte, Kate dormia profundamente quando o som de um telefone a acordou de sobressalto. Procurando o telefone às escuras, ela reconheceu imediatamente a voz de Jack.

- Chegaste bem em casa?

- Sim, cheguei - respondeu ela sonolenta. - Que horas são?

- Seis e pouco. Te acordei?

- Sim. Deitei tarde ontem à noite esperando a sua ligacao. Comecei a achar que tinhas esquecido da tua promessa.

- Não esqueci. Achei que precisava de algum tempo para te instalares.

- Mas tinha certeza de que estaria acordada logo de madrugada, certo?

Jack riu-se.

- Desculpa. Como foi o voo? Como está?

- Bem. Cansada, mas bem.

- Então imagino que o ritmo da grande cidade já te pôs cansada de novo.

Ela riu-se, e a voz de Jack tornou-se séria.

- Quero que saibas uma coisa.

- O quê?

- Estou com saudades.

- Mesmo?

- Sim. Fui trabalhar ontem apesar da loja estar fechada, esperando avançar com a papelada, mas não consegui fazer grande coisa porque estava sempre pensando em ti.

- É bom ouvir isso.

- É verdade. Não sei como é que vou conseguir trabalhar durante as próximas duas semanas.

- Oh, vais conseguir.

- Talvez não consiga dormir, também.

Ela riu-se, sabendo que ele estava brincando.

- Então, não exageres agora. Não gosto muito de homens superdependentes, sabe. Gosto que os meus homens sejam homens.

- Então vou tentar me controlar.

Ela fez uma pausa.

- Onde estás agora?

- Estou sentado na varanda vendo o nascer do Sol. Porquê?

Kate pensou na vista que perdia.

- É bonito?

- É sempre, mas esta manhã, não estou gostando tanto como de costume.

- Porque não?

- Porque não estás aqui comigo.

Ela recostou-se na cama, arranjando uma posição confortável.

- Também estou com saudade.

- Espero que sim. Detestaria pensar que sou o único a me sentir desta maneira.

Ela sorriu, segurando o telefone junto ao ouvido com uma mão e enrolando distraidamente o fio com a outra, até que ao fim de vinte minutos se despediram relutantemente e desligaram o telefone.


Entrando no escritório mais tarde do que o costume, Kate sentiu finalmente os efeitos da sua turbulenta aventura começarem a afetá-la. Tinha dormido pouco, e quando olhara para o espelho depois de falar com Jack ao telefone, tivera a certeza de que parecia pelo menos uma década mais velha.


Como de costume, o primeiro lugar onde ia logo que chegava ao trabalho era à cantina para beber um café, e nessa manhã adicionou um segundo pacote de açúcar para lhe dar uma energia extra.

- Oh, olá, Kate - disse Penny contente, aparecendo por trás dela. - Pensei que nunca mais chegasses. Estou louca para ouvir tudo o que aconteceu.

- Bom dia - resmungou Kate, mexendo o café. - Desculpa o atraso.

- Já estou contente de teres conseguido voltar. Quase corri para o teu apartamento ontem à noite para falar contigo, mas não sabia a que horas irias chegar.

- Desculpa não ter telefonado, mas estava um pouco cansada depois da minha semana lá - disse ela.

Penny encostou-se ao balcão.

- Bem, isso não é surpresa nenhuma. Eu já percebi mais ou menos o que se passou.

- Que queres dizer?

Os olhos de Penny brilhavam.

- Imagino que não tenhas visto a tua mesa ainda.

- Não, acabei de entrar. Porquê?

- Bem - disse ela, erguendo as sobrancelhas -, parece que causaste boa impressão.

- De que estás falando, Penny?

- Vem comigo - disse Penny com um sorriso conspirador enquanto a conduzia de volta a redação.


Quando Kate viu a sua mesa, ficou de boca aberta. Ao lado do correio que acumulara durante a sua ausência estava uma dúzia de rosas, num belo arranjo dentro de um grande jarro transparente.

- Chegaram logo de manhã. Eu as recebi.

Mal ouvindo o que Penny tinha dito, Kate pegou no cartão encostado ao jarro e abriu-o imediatamente. Penny ficou atrás dela, espreitando por cima do seu ombro. O cartão dizia:

Para a mulher mais bela que conheço...
Agora que estou sozinho de novo, nada é como antes.
O céu está mais cinzento, o oceano mais sombrio.
Podes melhorar isso?
A única maneira é voltares para me ver.
Saudades,

Jack


Kate sorriu para o bilhete e enfiou-o novamente dentro do envelope, inclinando-se para cheirar o ramo.

- Deves ter tido uma semana memorável - disse Penny.

- Sim, tive - respondeu simplesmente Kate.

- Estou ansiosa por ouvir tudo - todos os detalhes picantes.

- Acho - disse Kate, olhando em volta para todas as pessoas na redação a olharem para ela discretamente - que seria melhor falar contigo mais tarde, quando estivermos sozinhas. Não preciso do escritório inteiro falando sobre o assunto.

- Eles já estão, Kate. Há muito tempo que não entregavam flores aqui. Mas está bem, falamos no assunto mais tarde.

- Disse quem enviou as flores?

- Claro que não. Para ser honesta, gosto de os deixar na expectativa. - Ela piscou depois de passar os olhos pela redação. - Escuta, Kate, tenho trabalho para fazer. Achas que poderíamos almoçar as duas hoje? Então poderemos conversar.

- Claro. Onde?

- Que tal o Mukini's? Aposto que não comeste sushi lá em baixo em Wilmington.

- Está ótimo. E Penny... obrigada por ter mantido isto em segredo.

- De nada.

Penny deu umas palmadinhas no ombro de Kate e voltou para o seu escritório. Kate inclinou-se sobre a mesa e cheirou novamente as rosas antes de mudar a jarra para o canto da mesa.


Começou a examinar o seu correio durante alguns minutos, fingindo não reparar nas flores, até a redação retomar o seu ritmo caótico. Assegurando-se de que ninguém estava olhando, pegou o telefone e ligou para a loja de Jack.

Ian atendeu o telefone.

- Um momento, acho que ele está no escritório. Quem fala, por favor?

- Diga que é alguém que quer marcar umas aulas de mergulho para daqui a duas semanas. - Tentou soar o mais distante possível, não sabendo se Ian estava a par da relação entre eles.
Ian pediu-lhe que aguardasse e seguiu-se um breve momento de silêncio. Depois ouviu um ruído na linha e Jack atendeu.

- Em que posso ajudá-la? - perguntou ele, soando um pouco cansado.

Ela disse simplesmente:

- Não devias ter feito isso, mas adorei.

Ele reconheceu a voz dela, e o seu tom de voz animou-se. - Ei, é voce. Fico satisfeito por saber que elas chegaram. Estavam bem?

- São belas. Como é que sabias que eu adoro rosas?

- Não sabia, mas nunca ouvi falar de uma mulher que não gostasse, por isso arrisquei.

Ela sorriu.

- Então envias rosas a muitas mulheres?

- Milhões. Tenho muitas admiradoras. Os instrutores de mergulho são quase como estrelas de cinema, sabias.

- Não me digas?

- Quer dizer que não sabias? E eu achando que você era apenas mais uma fã.

Ela riu.

- Muito obrigada.

- De nada. Alguém perguntou quem tinha mandado?

Ela sorriu.

- Claro.

- Espero que tenhas dito coisas boas.

- E disse. Disse que tinhas sessenta e oito anos e eras gordo, com um terrível defeito de fala que tornava impossível compreender-te. Mas como tive tanta pena de ti aceitei almoçar contigo. E agora, infelizmente, andas me perseguindo.

- Ei, isso magoa - disse ele. Ele fez uma pausa. - Pois é... espero que as rosas te façam lembrar que estou pensando em ti.

- Talvez - disse ela acanhadamente.

- Bem, estou pensando em ti e não quero que esqueças. Ela olhou para as rosas.

- Igualmente - disse ela baixinho.


Depois de desligarem, Kate permaneceu calmamente sentada durante um momento, pegando de novo no cartão. Voltou a lê-lo, e em vez de o colocar junto às flores, escondeu-o na bolsa. Conhecendo os seus colegas, tinha certeza de que alguém o leria quando ela não estivesse ali.



- Então, como é ele?

Penny estava sentada de frente para Kate à mesa do restaurante. Kate entregou a Penny as fotografias das férias.

- Não sei por onde começar.

Olhando para uma fotografia de Jack e Kate na praia, Penny falou sem olhar para ela.

- Começa do princípio. Não quero perder nada.

Uma vez que Kate já lhe havia contado sobre o seu encontro com Jack nas docas, continuou a sua história a partir do fim de tarde em que foram andar de barco. Contou a Penny como deixara propositadamente o casaco a bordo como pretexto para voltar a vê-lo - ao que Penny respondeu - Perfeito! - passando para o almoço do dia seguinte e finalmente para o jantar. Recapitulando os últimos quatro dias que passaram juntos, ela deixou muito pouco de fora, enquanto Penny escutava com uma atenção arrebatada.

- Parece que tiveste um passeio maravilhoso - disse Penny, sorrindo como uma mãe orgulhosa.

- Tive. Foi uma das melhores semanas que já tive. Só que...

- O quê?

Levou um momento para responder.

- Bem, Jack disse uma coisa para o fim que me pôs a pensar sobre onde tudo isto iria parar a partir daqui.

- O que é que ele disse?

- Não foi apenas o que ele disse, mas como disse. Parecia que não tinha certeza se queria que nos vissemos de novo.

- Pensei que ias a Wilmington outra vez daqui a duas semanas.

- E vou.

- Então qual é o problema?

Ela mexia-se na cadeira irrequieta, tentando concentrar os seus pensamentos.

- Bem, ele ainda está tentando esquecer Sarah e... e não tenho bem certeza se alguma vez ele conseguirá esquecê-la.

Penny riu-se de repente.

- Qual é graça? - perguntou Kate, surpreendida.

- És tu, Kate. O que é que esperavas? Sabias que ele ainda tentava esquecer de Sarah antes de ires. Lembra, foi o seu amor "eterno" que tu achaste tão atraente em primeiro lugar. Achaste que ele iria esquecer-se completamente de Sarah em dois dias, só porque vocês os dois se deram tão bem?

Kate estava com um ar envergonhado e Penny riu-se de novo.

- Pensaste, não pensaste? Foi exatamente isso que pensaste.

- Penny, tu não estavas lá... Não podes imaginar como tudo parecia tão certo entre nós, até à última noite.

A voz de Penny enterneceu-se.

- Kate, eu sei que existe uma parte de ti que acredita que pode mudar uma pessoa, mas a realidade é que não podes. Podes mudar somente a ti e Jack pode mudar a si próprio, mas tu não podes fazer isso por ele.

- Eu sei isso...

- Mas não sabes - disse Penny, interrompendo-a delicadamente. - Ou se sabes, não queres ver dessa maneira. A tua visão, como se costuma dizer, ficou toldada.

Kate pensou durante um momento sobre o que ela tinha dito.

- Vamos olhar objetivamente para o que aconteceu a Jack, está bem? - perguntou Penny.

Kate acenou que sim com a cabeça.

- Embora tu soubesses alguma coisa sobre Jack, ele não sabia absolutamente nada sobre ti. No entanto foi ele que te convidou para passear de barco. Por isso alguma coisa entre vocês deve ter feito logo faísca. Em seguida, viste-o de novo quando foste buscar o teu casaco, e ele te convidou para almoçar. Ele falou de Sarah e depois te convidou para ires a casa dele jantar. Depois disso, passaram quatro dias maravilhosos juntos em que tiveram a oportunidade de se conhecer - e amar - um ao outro. Se tivesses me dito antes de partires que era isso o que iria acontecer, não teria acreditado que fosse possível. Mas aconteceu, é isso que importa. E agora, os dois estão fazendo planos para voltarem a se ver. Ao meu ver, tudo realmente foi maravilhoso.

- Então, queres dizer que não devo me preocupar se ele vai alguma vez esquecer de Sarah ou não?

Penny abanou a cabeça.

- Não exatamente. Mas olha, viva um dia de cada vez. A verdade é que até agora passaram apenas alguns dias juntos. Isso não é tempo suficiente para se tomar uma decisão. Se fosse voce, veria primeiro como é que ambos se sentem durante as próximas duas semanas, e quando estiveres com ele da próxima vez é provável que saibas muito mais do que aquilo que sabes agora.

- Achas que sim? - Kate olhou para a amiga com um ar preocupado.

- Eu tive razão quando insisti para que lá fosses, não tive?


Enquanto Kate e Penny almoçavam, Jack trabalhava no seu escritório por detrás de uma gigantesca pilha de papéis até ao momento em que a porta se abriu. Chris Shepard entrou, certificando-se de que o seu filho estava sozinho antes de fechar a porta. Depois de se sentar na cadeira em frente à mesa de Jack, Chris tirou o tabaco e as mortalhas do bolso e começou a enrolar o seu cigarro.

- Esteja à vontade e sente-se. Como pode ver, não tenho muito que fazer. - Jack apontou para a pilha de papéis.

Chris sorriu.

- Telefonei para ca duas vezes e disseram-me que não tinhas aparecido a semana inteira. Que andas fazendo?

Recostando-se na sua cadeira, Jack olhou para o pai.

- Tenho certeza de que já sabe a resposta da sua pergunta, e essa é provavelmente a razão porque aqui está.

- Estiveste com Kate o tempo todo?

- Sim, estive.

Continuando, Chris perguntou com um ar de indiferença:

- Então, o que é que vocês fizeram?

- Fomos andar de barco, passear na praia, conversamos... Sabe, apenas nos conhecendo melhor.

Chris acabou de enrolar o seu cigarro e pô-lo na boca. Tirou um isqueiro do bolso da camisa, acendeu o cigarro, e inalou profundamente. Exalando, mostrou a Jack um sorriso maroto.

- Grelhaste os bifes como eu te ensinei?

Jack fez um sorriso tolo.

- Claro.

- Ela ficou impressionada?

- Ficou muito impressionada.

Chris acenou com a cabeça e tragou novamente. Jack podia sentir o ar no escritório começar a ficar viciado.

- Então ela tem pelo menos uma boa qualidade, não é?

- Tem muito mais do que uma, pai.

- Gostaste dela, não gostaste?

- Muito.

- Mesmo apesar de não a conheceres muito bem?

- Sinto como se soubesse tudo sobre ela.

Chris acenou com a cabeça e nada disse por um momento. Por fim, perguntou:

- Vais voltar a vê-la?

- Na verdade, ela volta daqui a duas semanas com o filho. Chris observou com atenção a expressão de Jack. Depois, levantou-se e caminhou para a porta. Antes de a abrir, voltou-se e olhou para o filho.

- Jack, posso te dar um conselho?

Surpreendido com a partida abrupta do pai, respondeu:

- Claro.

- Se gostas dela, se ela te faz feliz, se sentes como se a conhecesses, então não a deixes partir.

- Porque estás dizendo isso?

Chris olhou diretamente para Jack e deu outro trago no seu cigarro.

- Porque se eu te conheço, vais ser voce a terminar com a relação, e eu estou aqui para tentar impedir se for possível.

- De que é que estás falando?

- Sabes exatamente do que estou falando - disse ele baixinho. Dando meia volta, Chris abriu a porta e deixou o escritório de Jack sem mais uma palavra.

Mais tarde nessa noite, com os restos dos comentários do pai a rolarem na sua cabeça, Jack acabou por não conseguir dormir. Levantou-se da cama e foi até à cozinha, sabendo o que precisava de ser feito. Na gaveta, ele encontrou o papel e a caneta que sempre usava quando a sua mente estava em conflito, e sentou-se com a esperança de pôr os seus pensamentos em palavras.

Dear Sarah, Não sei o que está acontecendo, e não sei se alguma vez saberei. Aconteceu tanta coisa ultimamente que não consigo entender aquilo por que estou passando.


Jack ficou sentado à mesa durante uma hora depois de ter escrito aquelas primeiras duas linhas, e por mais que tentasse, não conseguia pensar em mais nada para escrever.


Quando acordou na manhã seguinte, ao contrário da maioria dos outros dias, o seu primeiro pensamento não foi para Sarah.


Foi para Kate.


CONTINUA...

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