quarta-feira, 14 de maio de 2008

As Palavras que Nunca Te Direi - Cap 15

Capitulo 15




Quatro dias após Kate ter deixado Wilmington, Jack teve outro sonho, só que desta vez foi com Sarah.


No sonho eles encontravam-se num campo coberto de erva confinado por uma precipicio à beira mar. Caminhavam juntos, de mãos dadas conversando, quando Jack disse qualquer coisa que a fez rir. Subitamente ela desprendeu-se dele. Olhando por cima do ombro e rindo-se, ela desafiava Jack a persegui-la. Ele assim o fez, rindo-se também, sentindo-se quase como se sentira no dia em que tinham casado.

- Vem, Jack. Consegues apanhar-me? - chamava ela.

O som do riso depois de ela falar flutuava no ar em seu redor, soando como música.

Ele reparou que ela se dirigia para o precipicio. Ela parecia não perceber para onde ia.

Jack gritou para parar, mas em vez disso ela começou a correr mais depressa.

"Pára!" gritou ele de novo, embora desta vez soubesse que ela não o poderia ouvir. A sua voz diminuíra para o nada. O pânico que sentiu então foi maior do que qualquer coisa que alguma vez sentira na vida. Com todas as suas forças, ele obrigou as suas pernas a movimentarem-se mais depressa, mas elas começaram a cansar-se, tornando-se mais pesadas com cada passo que dava.

Não vou conseguir, pensou, entrando em pânico.

Estava apenas a alguns centímetros do precipício, "Não te mexas", gritou ele, mas mais uma vez saiu-lhe um murmúrio. Parou a alguns centímetros dela e estendeu a mão, respirando com dificuldade.

"Pensavas que ias perder-me?"

"Sim", disse ele baixinho, "e prometo que nunca mais deixarei que isso aconteça."

Jack acordou e sentou-se na cama, permanecendo depois acordado durante várias horas.


Quando finalmente voltou a adormecer, o fez, mas muito intermitentemente, e eram quase dez horas da manhã do dia seguinte quando conseguiu levantar-se. Ainda exausto e sentindo-se deprimido, não conseguia pensar em mais nada a não ser no sonho. Não sabendo o que fazer, telefonou para o pai, que foi tomar cafe com ele no lugar habitual.

- Não sei porque me sinto desta maneira - disse ele ao pai depois de alguns minutos de conversa.


- Simplesmente não consigo compreender.

O pai não respondeu. Em vez disso apenas olhou para o filho.

- Não é que ela tivesse feito alguma coisa para me desagradar - prosseguiu ele. - Passamos apenas um fim-de-semana prolongado juntos, e gosto verdadeiramente dela. Conheci o filho dela, otimo garoto. Só que... não sei. Não sei se serei capaz de continuar com isto.

Jack fez uma pausa.

- Continuar com o quê? - perguntou finalmente Chris. Jack mexeu o café distraidamente.

- Não sei se posso voltar a vê-la.

O pai levantou uma sobrancelha mas não respondeu. Jack prosseguiu.

- Talvez simplesmente não estivesse destinado a acontecer. Quer dizer, ela nem sequer aqui vive. Vive a mil quilómetros de distância, tem a sua própria vida, os seus próprios interesses. E eu aqui, levando uma vida completamente diferente. Talvez ela ficasse melhor com outra pessoa, alguém que pudesse ver regularmente.

Ele pensou no que tinha dito, sabendo que não acreditava inteiramente em si próprio. Mesmo assim, não queria contar o sonho ao pai.

- Quer dizer, como é que podemos construir uma relação se não nos vemos com frequência?

Mais uma vez o pai não disse nada. Jack continuou, como se falando consigo próprio.

- Se ela vivesse aqui e pudesse vê-la todos os dias, penso que me sentiria de maneira diferente. Mas com ela longe..

Ele não terminou, tentando compreender os seus próprios pensamentos. Depois de algum tempo falou de novo.

- Simplesmente não consigo ver como é que poderemos fazer isto funcionar. já pensei muito no assunto, e não vejo como poderia ser possível. Não quero mudar-me para Chicago, e tenho a certeza de que ela não quer mudar-se para ca. Assim, onde é que isso nos levaria?

Jack parou e esperou que o pai dissesse alguma coisa qualquer coisa, em resposta ao que dissera até àquele ponto. Mas durante algum tempo, ele não emitiu um único som. Finalmente suspirou e olhou para o lado.

- Me parece que estás a arranjar desculpas - disse Chris baixinho. - Estás tentando te convencer e estás me usando para te ouvir falar.

- Não, pai, não estou nada. Estou apenas tentando enxergar isto tudo.

- Com quem pensas que estás falando, Jack? - Chris abanou a cabeça. - às vezes juro que deves pensar que eu sou um broco e que passei a vida toda a vaguear sem aprender nada ao longo do caminho. Mas eu sei exatamente o que está acontecendo contigo. Habituaste-te de tal maneira a viver sozinho que tens medo do que poderá acontecer se realmente encontrares alguém que te possa afastar desse estado.


- Não tenho medo - protestou Jack.

O pai interrompeu-o abruptamente.

- Nem sequer consegues admitir isso para ti mesmo, não?


A decepção no seu tom de voz era inconfundível.


- Sabes, Jack, quando a tua mãe morreu, eu também arranjei desculpas. Ao longo dos anos, convenci-me de todo o tipo de coisas. E queres saber onde isso me levou?


Ele olhou fixamente para o filho.


- Estou velho e cansado, e pior do que tudo, estou sozinho. Se pudesse voltar atrás no tempo, mudaria muitas coisas em relação a mim , e diabos me levem se vou deixar que tu faças as mesmas coisas que eu fiz.


Chris fez uma pausa antes de continuar, o seu tom de voz enterneceu-se.


- Eu fiz mal, Jack. Fiz mal em não tentar encontrar outra pessoa. Fiz mal em sentir-me culpado em relação à tua mãe. Fiz mal em continuar a viver a minha vida da maneira como a vivi, sempre a sofrer por dentro e interrogando-me sobre o que ela teria pensado. Porque sabes o que mais? Penso que a tua mãe teria querido que eu encontrasse outra pessoa. A tua mãe teria querido que eu fosse feliz. E sabes porquê?

Jack não respondeu.

- Porque ela me amava. E se tu pensas que estás mostrando o teu amor por Sarah sofrendo da maneira como tens sofrido, então ao longo do caminho, eu devo ter falhado na maneira como te eduquei.

- Não falhou...

- Devo ter falhado. Porque quando olho para ti, vejo a mim, e para ser honesto, preferia ver outra pessoa. Gostaria de ver alguém que tivesse aprendido que o correto é seguir em frente e continuar a viver, que o correto é encontrar alguém que nos faça feliz. Mas neste momento, é como se estivesse a olhar para o espelho e me visse há vinte anos atrás.



Jack passou o resto da tarde sozinho, passeando na praia, pensando sobre o que o pai havia dito.


Olhando para trás, sabia que não tinha sido honesto desde o início da conversa e não ficou surpreendido que o pai tivesse percebido isso. Porque quisera então falar com ele? Quisera ele que o pai o confrontasse da maneira como o fez?

à medida que a tarde passava, a sua depressão transformou-se em confusão e depois numa espécie de entorpecimento.


Quando telefonou a Kate mais tarde naquela noite, os sentimentos de infidelidade que sentira como resultado do sonho tinham já acalmado o suficiente para que pudesse falar com ela. Ainda lá estavam, embora não tão fortes, e quando ela atendeu o telefone, ele sentiu-os diminuir ainda mais. O som da voz dela lembrava-lhe a maneira como ele se sentia quando estavam juntos.

- Ainda bem que telefonaste - disse ela alegremente. - Pensei muito em ti hoje.

- Também pensei em ti - disse ele. - Queria que estivesses aqui agora.

- Estás bem? Pareces um pouco triste.

- Estou bem... Apenas só, nada mais. Como foi o teu dia?

- Típico. Muito trabalho no jornal, muito trabalho em casa. Mas está tudo melhor agora que já ouvi a tua voz.

Jack sorriu.

- Kevin está por aí?

- Está no quarto dele lendo sobre mergulho. Disse-me que quer ser instrutor de mergulho quando crescer.

- Onde ele arranjou essa ideia?

- Não faço a mínima ideia - disse ela, em tom de brincadeira. - E tu? Que fizeste hoje?

- Não muito, na verdade. Não fui até à loja - tirei um dia de folga e vaguei pelas praias.

- Sonhando comigo, espero?

A ironia do comentário não lhe passou despercebida. Ele não respondeu diretamente.

- Senti mesmo muito a tua falta hoje.

- Só vim embora há poucos dias - disse ela ternamente. - Eu sei. E falando nisso, quando é que podemos voltar a nos ver?

Kate estava sentada na mesa da sala de jantar e deu uma olhada à sua agenda.

- Hum... que tal daqui a três semanas? Estava pensando que talvez pudesses vir pra ca desta vez. O Kevin tem um estágio de futebol de uma semana, e poderemos passar algum tempo sozinhos.

- Em vez disso não gostarias de vir pra cá?

- Seria melhor se viesses, se não te importares. já tenho muitos poucos dias de férias, e acho que conseguiríamos dar um jeito no meu horário. E além disso, acho que já está na hora de saíres da Carolina do Norte, apenas para que possas ver o que o resto do país tem para oferecer.

Enquanto ela falava, ele deu por si a olhar para a fotografia de Sarah na mesa de cabeceira. Levou alguns segundos antes de responder.

- Claro... suponho que posso fazer isso.

- Não pareces muito convencido.

- Estou.

- Há mais alguma coisa, então?

- Não.

Ela fez uma pausa, hesitante.

- Estás mesmo bem, Jack?

************


Foram precisos mais alguns dias e vários telefonemas para Kate para Jack voltar a sentir-se progressivamente melhor.


Mais do que uma vez deu por si a telefonar pela noite dentro, apenas para ouvir a voz dela.

- Olá - dizia ele -, sou eu outra vez.

- Olá, Jack, que aconteceu? - perguntava ela, sonolenta.

- Nada de especial. Queria apenas dizer boa noite antes de ires para a cama.

- Eu já estou na cama.

- Que horas são?

Ela olhou de relance para o relógio.

- Quase meia-noite.

- Porque é que estás acordada? Devias estar dormindo - brincava ele, e depois deixava-a desligar para que ela pudesse ter o seu descanso.

às vezes, quando não conseguia dormir, pensava na semana que passara com Kate, lembrando-se de como era boa a sensação de lhe tocar na pele, dominado pelo desejo de a ter nos seus braços de novo.

Depois, entrando no seu quarto, via a fotografia de Sarah perto da cama. E naquele momento o sonho irrompia com uma clareza de cristal.

Ele sabia que ainda andava perturbado com o sonho. No passado teria escrito uma carta a Sarah, o que o ajudaria a colocar as coisas em perspectiva. Depois, levava o Happenstance para o mar pelo mesmo rumo que ele e Sarah haviam tomado da primeira vez após a restauracao, selava a garrafa e atirava-a para o mar.

Estranhamente, não foi capaz de o fazer desta vez. Quando se sentou para escrever, as palavras simplesmente não vinham. Por fim, começando a ficar frustrado, obrigou-se, em vez disso, a dormir.



CONTINUA...



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