domingo, 1 de junho de 2008

As Palavras que Nunca Te Direi - Cap 18

Capitulo 18


- Estou ansioso pra te ver - disse Jack.


Estavam em meados de Novembro, duas semanas antes do Dia de Ação de Graças. Kate e Kevin iam de avião visitar os pais dela durante as férias, e Kate tinha combinado ir a Wilmington no fim-de-semana antes para passar algum tempo com Jack. Passara-se um mês desde a última vez que tinham estado juntos.

- Também estou ansiosa - disse ela. - E prometeste que finalmente iria conhecer o teu pai, certo?

- Ele quer fazer um jantar de Ação de Graças antecipado para nós, na casa dele. Está sempre perguntando o que tu gostas de comer. Quer causar uma boa impressão.

- Diz para não se preocupar. Qualquer coisa que ele faça será ótimo.

- É isso que digo mas consigo perceber que ele está nervoso.

- Porquê?

- Porque serás a primeira convidada lá de casa. Durante anos, tem sido apenas nós os dois.

- Estou quebrando uma tradição de família?

- Não. Gosto de pensar que estamos começando uma nova. Além disso, foi ele que se ofereceu, lembra?

- Achas que ele vai gostar de mim?

- Eu sei que vai.

Quando soube que Kate vinha, Chris Shepard fez algumas coisas que nunca tinha feito antes. Em primeiro lugar, contratou uma pessoa para limpar a pequena casa onde vivia, um trabalho que acabou por durar quase dois dias porque ele insistiu que a casa ficasse impecavelmente limpa. Também comprou uma camisa nova e uma gravata. Emergindo do quarto com a sua nova roupa, não pôde senão reparar na surpresa nos olhos de Jack.

- Que tal? - perguntou ele.

- Está muito bem, mas porque a gravata?

- Não é para ti - é para o jantar deste fim-de-semana. Jack continuou a fitar o pai com um sorriso irónico no rosto.

- Está nervoso por causa do encontro, não está?

- Não.

- Pai - não tem de ser alguém que não é. Tenho certeza de que Kate gostara de voce de qualquer jeito.

Voltou ao quarto, pôs a camisa para fora e desprendeu a gravata. Jack viu-o desaparecer, e um momento mais tarde ouviu-o chamá-lo.

- O que foi agora? - perguntou Jack.

- Também vais usar uma gravata, não vais?

- Não planejava isso.

- Então altera os teus planos. Não quero que Kate descubra que eduquei alguém que não sabe vestir-se quando recebe uma companhia.

No dia antes da chegada dela, Jack ajudou o pai a terminar os seus preparativos.

- A que horas é que ela chega amanhã? - perguntou Chris.

- O avião chega por volta das dez horas. Devemos estar aqui às onze ou assim.

- A que horas ela talvez queira comer?

- Não sei.

Chris entrou na cozinha.

- Não perguntaste?

- Não.

- Então como é que vou saber quando porei o peru no forno?

Jack bebeu um gole de água.

- Faça as contas para comermos umas 7. Qualquer hora serve, tenho certeza.

- Achas que devias telefonar e perguntar?

- Não é assim tão importante.

- Talvez não para ti. Mas é a primeira vez que vou estar com ela, e se vocês os dois acabarem por se casar, não quero ser objeto de quaisquer piadas mais tarde.

Jack ergueu as sobrancelhas.

- Quem disse que nos vamos casar?

- Ninguém.

- Então porque falou no assunto?

- Porque - disse ele rapidamente - achei que um de nós devia, voce nao parece querer...

Jack fitou o pai.

- Então, pensa que me devo casar com ela?

Chris piscou o olho ao responder.

- Não interessa o que eu penso, é o que tu pensas que é importante, não é?

Mais tarde nessa noite, Jack abriu a porta da frente no momento em que o telefone começou a tocar. Depois de correr para ele, ouviu a voz de que estava à espera.

- Jack? - perguntou Kate. - Parece que estás sem fôlego.

Ele sorriu.

- Oh, olá, Kate. Acabei de entrar. Estive na casa do meu pai o dia inteiro preparando as coisas. Ele está mesmo ansioso por te conhecer.

Seguiu-se uma pausa desconfortável.

- Em relação a amanhã... - disse ela por fim.

Ele sentiu um aperto na garganta.

- O que é que tem amanhã?

Ela demorou-se a responder.

- Lamento muito, Jack... Não sei como te dizer isto, mas não vou poder ir a Wilmington.

- Aconteceu alguma coisa?

- Não, está tudo bem. É que surgiu uma coisa de última hora. Uma grande conferência que tenho de ir.

- Que tipo de conferência?

- É para o meu trabalho. - Ela fez de novo uma pausa. - Sei que parece horrível, mas não iria se não fosse mesmo muito importante.

Ele fechou os olhos.

- Para que é?

- É para os grandes diretores de jornais e midia, têm um encontro em Dallas este fim-de-semana. Penny achou que seria uma boa ideia se eu conhecesse alguns deles.

- Acabaste mesmo de saber isso?

- Não... quer dizer, sim. Bem, eu sabia que ia haver um encontro, mas não era para eu ir. Normalmente os colunistas não são convidados, mas Penny mexeu os pauzinhos e conseguiu me levar com ela. - Ela hesitou. - Lamento mesmo muito, Jack, mas como disse, seria uma oportunidade maravilhosa de me conhecerem, e é uma oportunidade única na vida.

Ele ficou calado durante um momento. Depois disse simplesmente:

- Eu compreendo.

- Estás zangado comigo, não estás?

- Não.

- Tens certeza?

- Tenho.

Ela sabia pelo seu tom de voz que ele não dizia a verdade, mas achou que nada havia que pudesse dizer que o fizesse sentir-se melhor.

- Pedes desculpa ao teu pai por mim?

- Sim, eu peco.

- Posso telefonar este fim-de-semana?

- Se quiseres.

- Jack, nao esqueca que eu te amo, ta?

Desligou.

No dia seguinte jantou com o pai, que fez o possível para minimizar o assunto.

- Se é como ela disse - explicou o pai -, tinha uma boa razão. Ela não está pode pôr o emprego em segundo plano. Tem um filho para criar, e tem de fazer o seu melhor para cuidar do sustento dele. Além disso, é apenas um fim-de-semana, não é o fim do mundo.

Jack acenava que sim com a cabeça, escutando o pai mas ainda aborrecido com tudo aquilo. Chris continuou:

- Tenho certeza de que vocês os dois vão conseguir fazer as coisas funcionar. Na verdade, ela vai provavelmente fazer alguma coisa verdadeiramente especial da próxima vez que estiverem juntos.

Jack nada disse. Chris deu algumas dentadas antes de falar de novo.

- Tens de compreender, Jack. ela tem responsabilidades, tal como voce, e às vezes essas responsabilidades têm prioridade. Tenho certeza de que se alguma coisa acontecesse na loja que tivesses de resolver, terias feito a mesma coisa.

Jack recostou-se na cadeira, afastando o seu prato ainda cheio para o lado.

- Eu compreendo tudo isso, pai. Só que já faz um mês que não a vejo, e estava mesmo ansioso.

- Acha que ela também não queria?

- Ela disse que queria.

Chris debruçou-se sobre a mesa e empurrou o prato de Jack para a frente dele de novo.

- Come o teu jantar - disse. - Passei o dia inteiro cozinhando, e não vais desperdiçá-lo.

Jack olhou para o seu prato. Apesar de não estar com fome, pegou no garfo e comeu um bocado.

- Sabes - disse o pai enquanto comia -, esta não é a última vez que isto vai acontecer, não devias ficar tão depimido por causa disto agora.

- Que quer dizer?

- Quero dizer que enquanto os dois continuarem a viver a mil quilómetros de distância, coisas como estas vão acontecer, e não se verão com tanta frequência como qualquer um de voces desejaria.

- Pensa que não sei isso?

- Sei que sim. Mas não sei se algum dos dois tem coragem para fazer algo.

- Quando era novo - continuou Chris, não percebendo a expressão amarga do filho - as coisas eram muito mais simples. Se um homem amasse uma mulher, ele pedia-a em casamento, e depois eles viviam juntos. Mas vocês dois, é como se não soubessem o que fazer.

- Já lhe disse antes, não é assim tão fácil...

- Claro que é. Se a amas, então descobre uma maneira de ficar com ela. Simples assim. Se surgisse alguma coisa e vocês não pudessem se ver durante um fim-de-semana, não agiriam como se a vida tivesse terminado. - Chris fez uma pausa antes de continuar. - O que vocês dois estão fazendo não é natural, e a longo prazo, não vai funcionar. Sabes isso, não sabes?

- Sei - disse Jack simplesmente, desejando que o pai parasse de falar no assunto.

O pai levantou as sobrancelhas, aguardando. Como Jack não acrescentou mais nada, Chris falou de novo.

- "Sei"? É tudo o que tens a dizer?

Ele encolheu os ombros.

- Que mais posso dizer?

- Podes dizer que da próxima vez que estiverem juntos, os dois vão resolver o assunto. É isso que podes dizer.

- Está bem - vamos tentar resolver o assunto.

Chris pousou o garfo e olhou severamente para o filho.

- Eu não disse tentar, Jack, disse que os dois vão resolver o assunto.

- Porque insiste tanto nisso?

- Porque - disse ele - se vocês não resolverem o assunto, eu e tu vamos continuar comendo sozinhos durante os próximos vinte anos.

No dia seguinte, Jack saiu com o Happenstance logo de manhã e permaneceu no mar até depois do por do Sol. Ele não telefonara na noite anterior, dizendo a si mesmo que era tarde demais e que ela estaria dormindo. Era mentira e ele sabia, mas simplesmente não queria falar com ela ainda.

A verdade é que estava ainda aborrecido com o que ela tinha feito, e o melhor lugar para ele pensar no assunto era o oceano, onde ninguém o podia importunar. Durante a maior parte da manhã ficou a se perguntar se ela tinha ideia de como aquilo tudo o aborrecia. Provávelmente não - convenceu-se - caso contrário não o teria feito.

Isto é, se ela gostasse dele.

Jack deixara a decepcao falar por si mas apos esse tempo olhando para o oceano viu que seu pai tinha razão. Ela tinha de fato responsabilidades que não podia ignorar, e enquanto eles continuassem a viver vidas separadas, coisas daquelas iriam continuar a surgir. E claro que ela gostava dele, o amava.


Apesar de não ficar satisfeito com isso, perguntava a si mesmo se todas as relações tinham momentos como aquele. A verdade é que ele não sabia. A outra única verdadeira relação que tivera fora com Sarah, e não era fácil comparar as duas. Para começar, ele e Sarah eram casados e viviam debaixo do mesmo teto. Mais até, conheciam-se desde a infância, os tempos eram outros, não tinham tido as mesmas responsabilidades que tanto Jack como Kate tinham agora.


Era diferente e nao podia comparar.

Mesmo assim havia algo que ele não podia ignorar, com Sarah sempre que questionavam o futuro ou tinham que tomar uma decisao, faziam juntos sem ameacar a relacao.Nem uma única vez lhe passara pela cabeça que qualquer dos dois não fosse capaz de sacrificar tudo um pelo outro.

Kate e ele, por outro lado, ainda não tinham isso. Conheciam-se há muito pouco tempo mas eventualmente eles chegariam la.

Não seria assim? Estava confuso e sabia que era dificil analisar sua relacao com Kate afinal ele nunca fizera isso antes. Mas nada disso mudava a vontade de querer estar perto dela, a saudade que sentia, a dor no coracao por nao te-la ao seu lado.

Jack telefonou a Kate logo que chegou a casa naquela noite.

- Olá - respondeu ela sonolenta.

Ele falou baixinho para o telefone. - Ei, sou eu.

- Jack?

- Desculpa ter te acordado, mas deixaste duas mensagens na secretaria.

- Fico contente por teres telefonado. Achei que nao ia ouvir tua voz.

- Durante um tempo, não quis.

- Ainda estás zangado comigo?

- Não - disse ele baixinho. - Triste, talvez, mas não zangado.

- Por não estar aí este fim-de-semana?

- Não. Por não estares aqui a maior parte do tempo.

Naquela noite ele dormiu mal. Sonhava coisas terriveis,ora com Sarah ora com Kate. Mas o ultimo minuto de seu sono conturbado o deixou realmente em agonia. Estava em Chicago com Kate passeando, olhavam vitrines quando de repente tudo ficou escuro e tudo que ele pode ver foi um carro e um grito de dor. Sangue. Ele gritava:

- Kate! Kate!

Ao chegar perto da mulher estendida ao chao, ele sentiu o toque na mao.

- Estou aqui.

Ele a abracou desesperado.

Jack acordou e sentou-se na cama, transpirando. Limpando a cara com o lençol, permaneceu acordado por muito tempo.


Mais tarde nesse dia, Jack encontrou-se com o pai.

- Acho que quero casar com ela, pai.

Estavam pescando à beira do pontão com uma dúzia de outras pessoas. Chris levantou o olhar surpreso.

- Há dois dias parecia que não querias voltar a vê-la.

- Pensei muito desde então.

- Parece que sim - disse Chris baixinho. Ele recolheu a sua linha, verificou a isca e depois lançou-a de novo à água.

- Amas a Kate? - perguntou Chris.

Jack olhou para ele, surpreendido.

- Claro que amo. Já lhe disse isso algumas vezes.

Chris abanou a cabeça.

- Não... não disseste - afirmou ele sinceramente. - já falámos muito nela - disseste-me que ela te fazia feliz, que sentes que a conheces, e que não queres perde-la mas nunca me disseste que a amavas.

- É a mesma coisa.

- Tens certeza?

- Claro que tenho - dissera ele logo a seguir. - E mesmo que não seja a mesma coisa, eu a amo de verdade.

Chris olhou para o filho durante um momento antes de finalmente desviar o olhar.

- Queres casar com ela?

- Quero.

- Porquê?

- Porque a amo, claro. Isso não chega?

- Talvez.

Jack recolheu a sua linha, frustrado.

- Não foi o primeiro a achar que devíamos casar?

- Fui.

- Então porque está questionando agora?

- Porque quero ver se tomaste a decisao pelas razões certas. Há dois dias, nem sequer tinhas certeza se querias voltar a vê-la. Agora estás pronto para casar. Parece-me uma grande reviravolta, e quero ter a certeza de que é por causa daquilo que sentes por Kate - e que não tem nada a ver com Sarah.

A introdução do nome dela doeu-lhe um pouco.

- Sarah não tem nada a ver com isto - disse Jack rapidamente. Ele abanou a cabeça e suspirou profundamente. - Sabe, pai, às vezes não o compreendo. Todo este tempo dizendo-me que tenho de esquecer o passado, de que tinha de encontrar alguém. E agora que encontrei, parece querer que eu desista.

Chris pôs a sua mão livre no ombro de Jack,

- Não quero que desistas de nada, Jack. Fico contente por teres encontrado Kate, fico contente por saber que a amas, e sim, é verdade que espero que cases com ela. Eu apenas disse que se vais casar, então é melhor que o faças pelas razões certas. O casamento é entre duas pessoas, não três. E não seria justo para ela se te casasses sem esclarecer esta questão.

Ele demorou algum tempo a responder.

- Pai, quero casar-me porque a amo. Quero passar a minha vida com ela.

O pai manteve-se em silêncio durante muito tempo, olhando para o mar. Depois disse algo que fez Jack desviar o olhar.

- Então, em outras palavras, estás me dizendo que já te esqueceste completamente de Sarah?

Jack não sabia a resposta.


CONTINUA...

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